quarta-feira, 21 de julho de 2010

OLIVER STONE DESMASCARA LARRY ROHTER

por Mair Pena Neto
do Direto da Redação

Vou me permitir ocupar esse espaço com a carta enviada pelo cineasta norte-americano Oliver Stone ao The New York Times para refutar crítica a seu documentário “Ao sul da fronteira” (South of the Border), escrita pelo jornalista (se é que se pode chamá-lo assim) Larry Rohter.

Para quem não se lembra, Rohter é aquele jornalista que tentou desqualificar o presidente Lula, apresentando-o como um bêbado, incapaz de dirigir os destinos de um país. O New York Times deveria enquadrar a matéria de Rohter sobre Lula e pregá-la na parede junto a várias outras, de diversas publicações, que exaltam Lula cada vez mais e o apresentam como um dos maiores estadistas da atualidade.

Rohter é especializado em tentar desconstruir personagens ligados às causas populares, e o que fez com Lula já havia feito com Rigoberta Menchu e continua a tentar fazer com Hugo Chávez. Certamente o documentário de Oliver Stone, que trata das mudanças na América do Sul conduzidas por gente como Lula, Chávez e Evo Morales, incomodou Rohter, assim como a crítica que o cineasta faz às distorções dos fatos promovidas pela mídia.

O jornalista do The New York Times escreveu uma crítica intelectualmente desonesta, que foi desconstruída, item a item, por Oliver Stone e os roteiristas do filme Mark Weisbrot e Tariq Ali. Não vou me estender mais, pois o melhor são os argumentos dos autores do filme. A tradução é minha e pode conter algumas imprecisões. Quem quiser lê-la no original é só ir à página do filme http://southoftheborderdoc.com/oliver-stone-responds-to-attack-from-the-new-york-times-larry-rohter/


Larry Rohter atacou nosso filme "South of the Border" por "erros, imprecisões e perda de detalhes". Mas um exame cuidadoso dos detalhes revela que os erros, imprecisões e perda de detalhes são dele, e que o filme é factualmente preciso. Nós vamos documentar isso para cada um dos seus ataques. Nós vamos mostrar, então, que há evidência de hostilidade e conflito de interesses na sua tentativa de desacreditar o filme. Finalmente, nós pedimos que sejam considerados os muitos erros factuais nos ataques de Rohter, assinalados abaixo, e que o The New York Times publique a correção integral desses numerosos erros.

1) Ao acusar o filme de informação incorreta, Rohter escreve que "um vôo de Caracas para La Paz passa na maior parte sobre a Amazônia e não sobre os Andes..." Mas a narrativa não diz que o vôo passa na maior parte sobre os Andes, mas apenas que passa sobre os Andes, o que é verdade. (Fonte: Google Earth)

2) Também na categoria de má informação, Rohter escreve "os Estados Unidos não 'importa mais petróleo da Venezuela do que qualquer outra nação da Opep', honra que pertenceu à Arábia Saudita durante o período 2004-10".

A citação mencionada por Rohter aqui foi feita no filme pelo analista da indústria do petróleo Phil Flynn, que aparece por cerca de 30 segundos em um clip da TV americana. E revela que Rohter está errado e Flynn, certo. Flynn está falando em abril de 2002 (o que está claro no filme), então é errado Rohter citar a data entre 2004-2010. Se nós olhamos para o período entre 1997-2001, que é a data relevante para o comentário, Flynn está correto. A Venezuela liderou as importações de petróleo dos EUA entre os países da Opep nesse período. (Fonte: US Energy Information Agency for Venezuela).

3) Rohter tenta desacreditar a breve descrição que o filme faz da disputa presidencial na Venezuela em 1998:

"Como South of the Border mostra, o principal oponente de Mr Chávez na sua primeira tentativa pela presidência em 1998, era ‘a ex-miss universo, loura, 1,77m’ chamada Irene Sáez, e a disputa ficou conhecida como a eleição entre a Bela e a Fera. Mas o principal oponente de Mr. Chávez então não era a senhora Sáez, que terminou em terceiro, com menos de 3% dos votos. Era Henrique Salas Romer, um ex-governador de estado, que recebeu 40% dos votos."

A crítica de Rohter é enganosa. A descrição da disputa presidencial no filme, citada por Rohter, é de Bart Jones, que cobria a Venezuela para a Associated Press à época. A descrição é precisa, a despeito do resultado final. Na maior parte da disputa, que começou em 1997, Irene Sáez era de fato a principal oponente, e a disputa foi apresentada como a "Bela e a Fera". Nos seis meses anteriores à eleição, ela começou a cair e Salas Romer conquistou apoio, com seus 40% mostrando uma decisão tardia do Copei e da AD (os dois maiores partidos da Venezuela naquele tempo, que governaram o país por quatro décadas) em apoiá-lo (Veja, por exemplo, esse artigo de 2008 da BBC, que descreve a disputa como no filme, e sequer menciona Salas Romer:

http://news.bbc.co.uk/2/hi/americas/7767417.stm).

A descrição de Rohter faz parecer que Sáez era uma candidata menor, o que é absurdo.

4) Rohter tenta rotular o tratamento do filme ao golpe de 2002 na Venezuela como "teoria conspiratória". Ele escreve: "Como Mr. Stone fez com o assassinato de Kennedy, essa parte de South of the Border se apóia na identidade de um atirador ou de atiradores que podem ou não ter tomado parte de uma grande conspiração."

Essa descrição do filme é completamente falsa. O filme não faz nenhuma afirmação com base em atiradores e nem apresenta qualquer teoria de "grande conspiração" com base em qualquer atirador. Ao invés disso, o filme assinala duas questões sobre o golpe: (1) Que a mídia venezuelana (e isso foi repetido pela mídia dos EUA e internacional) manipulou imagens para parecer que um grupo de apoiadores de Chávez tinha atirado e matado 19 pessoas no dia do golpe. Essa manipulação das imagens é demonstrada claramente no filme, e não se "apóia pesadamente na conta de Gregory Wilpert", como Rohter falsamente alega. As imagens falam por si. (2) O governo dos Estados Unidos estava envolvido no golpe. Ironicamente, é Rohter quem se apóia em teorias conspiratórias, citando uma narrativa duvidosa em particular, que ele argumenta que deveria ter sido incluída no filme.

5) Rohter nos acusa de "distorcer fatos e omitir informações" sobre a Argentina por permitir "Mr. Kirchner e sua sucessora - e mulher - Cristina Fernández de Kirchner afirmarem que "nós começamos uma política diferente da anterior".

"Na realidade, o antecessor de Mr. Kirchner, Eduardo Duhalde, e o ministro da Economia, Roberto Lavagna, foram os arquitetos da mudança de política e da subsequente recuperação da economia, que começou enquanto Mr. Kirchner ainda era o obscuro governador de uma pequena província na Patagônia".

Essa crítica é algo obscura e provavelmente ridícula. Os Kirchner estiveram na presidência por cinco dos seis anos da extraordinária recuperação econômica argentina, nos quais a economia cresceu 63%. Algumas das políticas que possibilitaram essa recuperação começaram em 2002, outras em 2003, e até mais tarde. Quais são exatamente os "fatos distorcidos" e a "informação omitida" aqui?

6) Rohter tenta criar celeuma pelo fato do logo da Human Rights Watch aparecer por um par de segundos na tela, durante o debate sobre o duplo padrão de Washington em relação aos direitos humanos. O filme não diz ou sugere nada sobre a HRW. Mais importante, na sua entrevista com Rohter, o diretor da HRW Américas, José Miguel Vivanco, confirma exatamente o que o filme diz, que existe um duplo padrão nos EUA, que se foca nas alegações de abusos contra os direitos humanos na Venezuela, enquanto ignora alegações mais graves, mais numerosas e com mais substância na Colômbia. "É verdade que muitos dos ferozes críticos de Chávez em Washington fecharam os olhos para os estarrecedores registros de violação aos direitos humanos na Colômbia", diz Vivanco.

7) Rohter ataca o co-roteirista Tariq Ali por dizer que "o governo [da Bolívia] decidiu vender o fornecimento de água de Cochabamba para a Bechtel, uma empresa americana". Rohter escreve. "Na realidade, o governo não vendeu o fornecimento de água, ele concedeu o gerenciamento do fornecimento por 40 anos a um consórcio que incluiu a Bechtel".

Rohter realmente se supera aqui. "Vender o fornecimento de água" a interesses privados é uma descrição mais justa do que aconteceu do que "concedeu o gerenciamento do fornecimento por 40 anos". As empresas obtiveram o controle do fornecimento de água à cidade e o lucro de sua venda.

Nós demos a Rohter uma enorme quantidade de informações factuais para sustentar os principais pontos do filme. Ele não apenas ignorou os principais aspectos do filme, como só selecionou para seu artigo citações que não estavam relacionadas a fatos e que poderiam ser usadas para ilustrar o que ele considerou tendencioso no diretor e co-autor. Isso não é jornalismo ético; na verdade é questionável se isso sequer é jornalismo.

Por exemplo, foi apresentada a Rohter evidência detalhada e documentada do envolvimento dos Estados Unidos no golpe de 2002. Esse foi um ponto essencial do filme, e corroborado no filme pelo depoimento do então editor do Washington Post, Scott Wilson, que cobriu o golpe de Caracas. Nas nossas conversas com Rohter, ele simplesmente dispensou todas essa evidências e nada disso apareceu no seu artigo.

Rohter deveria ter revelado seu conflito de interesses nessa resenha. O filme critica o corpo editorial do The New York Times pelo endosso ao golpe militar de 11 de abril de 2002 contra o governo democraticamente eleito da Venezuela, o que foi embaraçoso para o jornal. Mais ainda, Rohter escreveu um artigo em 12 de abril que foi mais além do endosso do Times ao golpe.

"Nem a derrubada de Mr.Chávez, um ex-coronel do exército, e nem a de Mr. Mahuad, dois anos atrás, podem ser classificadas como um golpe militar convencional na América Latina. As forças armadas não tomaram o poder na quinta-feira. Foi a expulsão de apoiadores do presidente que parecem ter sido responsáveis pelas mortes de 12 pessoas se tanto ao invés de centenas ou milhares, e os direitos políticos e garantias que foram restaurados ao invés de suspensos" - Larry Rohter, New York Times, 12 de abril de 2002.

Essas alegações de que o golpe não foi um golpe - feitas não apenas por Rohter - geraram a réplica de colegas de Rohter no The New York Times, com Tim Weiner, que escreveu um artigo dois dias depois no Sunday Week in Review chamado "Um golpe com qualquer outro nome! (New York Times, 14 de abril 2002).

Ao contrário do corpo editorial do NYT que fez uma ressentida retratação de sua postura pró-golpe alguns dias depois (incluída no nosso filme), Rohter parece ter se apegado às fantasias da extrema direita sobre o golpe. Não é surpreendente que alguém que apóia a derrubada militar de um governo democraticamente eleito não goste de um documentário como esse, que celebra os triunfos da democracia eleitoral na América do Sul na última década.

Mas ele deveria ao menos ter informado a seus leitores que o New York Times estava sendo atacado no documentário e também sobre seus próprios artigos: Em 1999 e 2000, ele cobriu a Venezuela para o Times, escrevendo muitas reportagens anti-Chávez. As reportagens tendenciosas e distorcidas da mídia sobre a América Latina são o tema principal do documentário, o que Rohter também convenientemente ignorou nas 1.665 palavras que tentaram desacreditar o filme.

Nós gastamos horas com Rohter ao longo de dois dias e demos a ele toda a informação que ele solicitou, apesar de sua hostilidade estar clara desde o início. Mas ele estava determinado a apresentar sua narrativa de intrépido repórter expondo descuidada produção cinematográfica. O resultado é uma tentativa muito desonesta de desacreditar o filme apresentando-o como factualmente impreciso - usando declarações enganosas, fora de contexto, trechos pinçados de entrevistas com o diretor e roteiristas, e ataques ad hominem (falaciosos). O Times deveria se desculpar de ter publicado isto. 

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