segunda-feira, 26 de julho de 2010

Honduras e o “poder inteligente”: Da intervenção humanitária ao humanismo golpista

Jorge Capelán (TORTILLA CON SAL)
do ARGENPRESS
Em 15 de julho de 2010 um grupo de ONGs de direitos humanos e grupos religiosos estadounidenses (1) enviaram uma carta à Secretaria de Estado Hillary Clinton acerca da situação no país centro americano pleiteando uma série de demandas para que “o governo e o povo de Honduras [retomem] totalmente o caminho da democracia, o estado de direito e o bom  governo”.


As organizações signatárias da carta dizem:

Que em Honduras se tem cometido "graves violações dos direitos humanos (...) desde a assunção ao governo de Porfirio Lobo Sosa em 27 de janeiro deste ano".

Que "muitas das pessoas ameaçadas, atacadas e assassinadas, pertenciam à Frente Nacional de Resistência Popular ou se opunham de outra forma ao golpe de estado que teve lugar em 28 de junho de 2009".

Da os nomes e dados de oito dos assassinados, ativistas sociais, dirigentes da resistência ao golpe de estado e ex-membros do gabinete do derrocado presidente Manuel Zelaya.

Que “os ativistas também tem informado sobre ataques aos que se lhes tem ameaçado por sua atividade política.”

Que, segundo a CIDH, também 'se está sequestrando, atacando e ameaçando aos filhos de dirigentes da Frente de Resistência, como estratégia para silenciar a resistência.'

Da os nomes e dados de dez jornalistas assassinados constatando que “Os jornalistas (...) seguem enfrentando ameaças de morte” da parte dos golpistas.

Que “os defensores dos direitos humanos são o branco específico de ameaças de morte e outros atos de intimidação” e que “nos primeiros seis meses da administração Lobo, práticamente nenhuma das violações que tiveram lugar depois de 28 de junho se está investigando seriamente.”

Que “ademais, o governo hondurenho não tem podido implementar medidas de proteção efetivas para as pessoas em risco segundo foi ordenado pela CIDH.”

Que “a liberdade de expressão também está submetida à restrições” por parte do governo, que pode fechar meios da imprensa, e da Suprema Corte de Justiça que destituiu a quatro juízes que abertamente se opuseram ao golpe.

Que “...se trata ademais da falta de ação por parte de Estado de Honduras para fazer frente a estes abusos e realizar as reformas necessárias”, o que faz com que se gere “um efeito intimidatório para o exercício da liberdade de expressão e de reunião.”

Até aqui tudo bem, não? Bom, nem tanto. Não nos deixemos deslumbrar pelo reconhecimento dos crimes dos golpistas e dos atuais governantes de Honduras. É que a par do que dizem as ONGs em sua carta à Secretaria de Estado, existem coisas importantes que não dizem.

Por exemplo, não dizem que Porfirio Lobo Sosa foi nomeado através de eleições que:

Tiveram lugar abaixo de uma situação de suspensão de garantias constitucionais e repressão extrema enquanto que os que rechaçavam o golpe de 28 de junho de 2009 e chamavam “farsa” a essas eleições, eram selvagemente reprimidos, perseguidos e até assassinados. (feito, este último, que as mesmas ONGs signatárias reconhecem).
Tiveram lugar enquanto que os governantes que depostos através do golpe estavam – e ainda estão – impedidos de ingressar no país.
Tiveram lugar apesar de que nunca se cumpriu a condição estabelecida pelos Acordos de San José-Tegucigalpa, de que os partidários do deposto presidente Manuel Zelaya deveriam estar de acordo com sua realização.
Haviam sido boicotadas disso tanto pela resistência como pela Organização das Nações Unidas, a União Europeia, a OEA e o Centro Carter.
No houveram observadores internacionais, exceto os do Instituto Democrático Nacional estadounidense financiado pelos próprios Estados Unidos, acusado de haver instigado o golpe.
O Tribunal Supremo Eleitoral de Honduras (TSE), designado ilegalmente pelos golpistas, fez públicos uns resultados absolutamente suspeitosos. As cifras do TSE e as da rede de ONGs contratada pelo governo estadounidense para legitimar o processo Façamos Democracia, coincidiram com surpreendente exatidão, mas não menos surpreendente foi a divergência entre suas cifras de participação: Ao dar por ganhador a Pepe Lobo com 61,89% das mesas escrutinadas, o TSE falava de uma absurda participação de mais de 60 por cento, enquanto que as ONGs do Departamento de Estado davam algo menos absurdo 48-49 por cento, cifra a qual o TSE terminou ajustando-se em seu informe final. Segundo fontes da Resistência, a participação foi de 21.5%. (2)
É impossível saber quanta gente realmente participou na “eleição”, mas não é impossível imaginar-se que muitos foram às urnas por medo à repressão, de serem despedidos por seus patrões golpistas ou de ser objeto de outras represálias.

Em síntese, os signatários da carta à Secretaria de Estado, apesar de constatarem uma série de evidentes, massivos e brutais crimes “tolerados” pela administração de Pepe Lobo, omitem o mais óbvio para qualquer observador desapaixonado; é dizer, que as eleições foram uma farsa, que o governo de Lobo é em si e de per si ilegítimo, que o sistema imperante em Honduras não é mais que o produto de um processo de normalização do golpe de estado de 28 de junho de 2009, que a única coisa que o atual governo de Tegucigalpa pode fazer para encaminhar o país até à democracia e o estado de direito é auto dissolver-se e, por último, que a grande promotora da idéia da legitimidade ao regime de Lobo é, precisamente, a Secretaria de Estado Hillary Clinton.



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