sábado, 30 de junho de 2012

Furacão: Juro que pensei que esses tempos tinham ficado no passado.

O Furacão me lembra em muito o time que foi rebaixado ano passado para a série B.

Um clube que, por falta, absoluta, de organização para o ano, padece, no meio dele, das consequências de seu amadorismo administrativo.

Confesso que fui a favor do retorno de Petraglia, em oposição à "trupe malucellina", que havia, justamente por esse amadorismo, nos levado, de novo, a mais um revés caseiro contra o maior rival e ao descenso no Brasileirão, coisa que me parecia praticamente impossível, por nosso perfil vencedor, adquirido desde que esse mesmo Petraglia tinha assumido o clube em 1995.

É verdade que desde 2006, excetuando uma participação que chegou a empolgar na Sul-americana daquele ano, o torcedor rubro-negro paranaense não teve lá muitos motivos para comemorar.

Em 2008 e 2009, quase tínhamos provado o rebaixamento e apesar do "ponto fora da curva", quando chegamos em 6° em 2010, depois de um início preocupante que felizmente não se consolidou após a parada para a Copa do Mundo daquele ano, viemos a sucumbir diante da falta de organização demonstrada em 2011.

Pois o Furacão repete 2011, só que um degrau abaixo.

Abaixo, porque a proposta apresentada pela chapa vencedora me fez sonhar com uma volta até certo ponto tranquila à divisão de elite, sem contar que pelo começo dos trabalhos, cheguei a pensar na quebra da hegemonia dos dois anos anteriores, de nosso maior rival, na disputa interna.

Gostei do estilo ofensivo do Carrasco e do resgate da personalidade de alguns valores que já tinham ficado em baixa na equipe, sucessão de erros do passado (desde antes da gestão Malucelli!), e que passaram a demonstrar condições de chegarem a mais altos voos, e mesmo dos remanescentes do desastre do rebaixamento, que pareciam ter ganho um folego novo sob os novos comandos, tanto extra, quanto intra-campo, embora discordasse das invenções e inconstância nas escalações, mas parece que a diretoria resolveu interferir na parte técnica, mudando justamente o que vinha dando certo.

O problema não era tanto o esquema de jogo, mas as constantes, e às vezes esdrúxulas escalações de jogadores em posições que não eram suas.

Fora isso, as contratações que se fariam necessárias ao longo, já, do Paranaense, visando mesmo conquistá-lo para entrarmos na "competição maior" com moral elevado, para entrarmos na competição já entrosados, com time definido e embalado, não foram feitas, ou, chegaram em pouca quantidade e em qualidade insuficiente para que se acomodassem, como se acomodaram e que agora vão ficando difíceis, posto que os campeonatos principais do semestre já estão em andamento.

Vemos chegar jogadores desconhecidos, normalmente atrelados aos técnicos, casos de Carrasco (Gabriel Marques, Rafael Schmitz, Liguera) e Drubsky (Naldo), até mesmo de Orlandelli (Zezinho), que demitidos do clube, talvez levem o ânimo desses que vieram, pois exemplos não faltam, no "futebol de oportunismo", de jogadores que chegam aos clubes através de empresários, dirigentes e técnicos porque a eles são atrelados, sabe-se lá até que ponto, e quando estes vão embora, costumam levar a "alma" daqueles.

Chega Jorginho num momento já dramático, onde o plantel já vem abalado psicologicamente, o que costuma dificultar bastante a recuperação ao longo de uma competição, sem muita perspectiva de encontrar reforços à altura de aparentemente resolver o problema, reféns de um estádio péssimo para quem precisa construir, ao contrário do perfil dos clubes que quando jogam fora preocupam-se mais em destruir para no pior das hipóteses tentar levar um empate, longe da grande massa torcedora, que mesmo em Curitiba não vinha lotando estádio ao longo do Paranaense, ou seja, não era fácil como se imaginava, mas está ficando complicadíssimo, diante da falta de planejamento.

Como otimista incorrigível e confiando na competência da equipe técnica, que não podemos condenar após o empate frente ao Bragantino, contando que pela necessidade premente de reforços que cheguem para resolver, a atual diretoria faça das tripas coração para resolver o problema, espero que ainda de tempo de podermos voltar a sonhar com a volta breve à 1ª divisão do Brasileiro, mas o momento é triste, como, de minha parte, não se via no Furacão desde os anos 70, quando eramos motivo de gozação constante por essas plagas e quando 1ª divisão era um sonho um tanto quanto errático, pela inconstância das equipes que conseguíamos montar.

Juro que pensei que esses tempos tinham ficado no passado.








sexta-feira, 29 de junho de 2012

O Partido da Imprensa


“Obviamente, esses meios de comunicação estão fazendo de fato a posição oposicionista deste País, já que a oposição está profundamente fragilizada”. (Judith Brito, presidenta da Associação Nacional de Jornais (ANJ) e executiva do Grupo Folha de São Paulo, em 18 de março de 2010).


“Com o tempo, uma imprensa cínica, mercenária, demagógica e corrupta formará um público tão vil quanto ela mesma”. (Joseph Pulitzer – 1847/1911)


Há 30 anos lido com o jornalismo — a partir de 1981. Formei-me na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em meados da década de 1980. Naquele tempo eu via a imprensa, a chamada “grande” imprensa como um instrumento de proteção da sociedade, além de considerá-la, apesar de pertencer à iniciativa privada e comercial, entidade democrática disposta a defender as liberdades de pensamento, de expressão, com o propósito de, por exemplo, apoiar ações que efetivassem a distribuição de renda, de terras, enfim, das riquezas produzidas pelos trabalhadores e acumuladas pelos empresários deste imenso País injusto. Eu era jovem, inexperiente e, além disso, no País não existia liberdade democrática, havia a censura, as pessoas não falavam de política no dia a dia, o que dificultava ainda mais perceber os reais interesses da imprensa empresarial. Como me formei na metade da década de 1980, cujo presidente da República era o general João Figueiredo, via a imprensa como um segmento que lutava em favor de uma sociedade que se tornasse justa, democrática e livre, processo este que somente acontece por intermédio da implementação constante de justiça social, por meio de políticas públicas desenvolvimentistas e distributivistas.

Naquele tempo, vivíamos em um regime de força, que teve seu auge nos idos de 1967 a 1977, a imprensa, recém-saída da censura, que “terminou”, definitivamente, em 1978, era vista por mim, jovem jornalista, como um instrumento de resistência aos que transformaram a República brasileira em uma ditadura militar, com a aquiescência e o apoio financeiro e logístico de influentes segmentos econômicos da sociedade civil, que viram na ascensão dos militares ao poder uma forma também de aumentar seus lucros, sem, no entanto, serem alvos de quaisquer questionamentos, já que havia a censura e a oposição partidária à ditadura se encontrava em um momento de perseguição política e sem voz ativa para ser ouvida, inclusive pela grande imprensa que, por ser comercial, bem como o braço ideológico das elites econômicas brasileiras, aliou-se aos novos donos do poder.

O jornalista minimamente alfabetizado, experiente e informado, independente de sua formação cultural, política e ideológica, independente de sua influência profissional e de seu contracheque, sabe (ou finge não saber) que os proprietários da imprensa privada são megaempresários, inquilinos do pico da pirâmide social mundial e pontas-de-lança dos interesses do capital. A imprensa burguesa censura a si mesma, quando considera que os interesses empresariais estão a ser contrariados. O faz de forma rotineira, ordinária, e expurga de seus quadros aqueles que não se unem ao pensamento único do Partido da Imprensa, que é o de disseminar, ou seja, propagar, aos quatro cantos, que não há salvação fora do mercado de ações, dos jogos bancários, da especulação imobiliária e da pasteurização das idéias, geralmente difundidas pelos doutores, mestres e professores das universidades e dos órgãos de supremacia e de espoliação internacional, como o BID, o Bird, o FED, a ONU, a OEA, a OTAN, o FMI, a OMC e a OMS.

Paralelamente, o Partido da Imprensa elege como adversários aqueles que contestam o sistema do capital como ele o é, ou seja, concentrador de renda, e exigem que ele se democratize no sentido de ele diminuir as diferenças entre as classes sociais e com isso efetivar uma equiparação, uma equanimidade entre os indivíduos que compõem o tecido social das nações que integram o planeta e são vítimas da geopolítica, que na verdade é a principal ferramenta do apartheid social e econômico entre os países.
Os inimigos da imprensa burguesa geralmente são os políticos que têm uma visão soberana em relação ao país que administram e acreditam em idéias e ideais que qualifiquem os homens como iguais. São políticos que elaboram e adotam programas distributivistas. São políticos nacionalistas, como os presidentes estadunidenses, porém sem ser xenófobos, e que lutam pelo desenvolvimento do país, a fim de conquistar tecnologias e pesquisas científicas próprias, ter o controle das diferentes energias, além de acreditar em uma diplomacia não alinhada aos países hegemônicos, com o objetivo de efetivar uma relação de igual para igual e não subordinada e servil, como muitos jornalistas do Partido da Imprensa, a soldo de seus patrões, de forma inadvertida e irresponsável apregoam e desejam.

A imprensa comercial acusa e sentencia, difama e calunia, dissimula e desinforma e mente se preciso for e se julgar que determinado governante não vai ler por sua cartilha, que é a mesma dos grandes conglomerados e trustes internacionais. Porque, como disse anteriormente, a imprensa é ponta-de-lança dos interesses do sistema capitalista excludente, além de ser seu braço ideológico. Ela é a vitrine desse modelo expropriador, useiro e vezeiro em propiciar o infortúnio e a derrota daqueles que ousaram um dia colocar em prática e até mesmo somente defender a tese, por exemplo, de um Brasil forte, independente e soberano. Caro leitor, o que concorda ou não comigo, a imprensa é necessária e tem de ter liberdade para informar, mas não deve e não pode tomar partidos, defender grupos e tentar pautar as instituições republicanas. Ser jornalista não é sinônimo de ser intelectual, dono e juiz da verdade, infalível ou senhor do poder. Ser jornalista é ouvir e compreender, se for possível, o pensamento, as idéias, os ideais, as opiniões, as teses, os projetos, os programas, os propósitos, as atitudes, as ações e até mesmo as ideologias dos atores sociais, políticos e econômicos.

O jornalista é a ponte que une o ator social e a informação à população, ao povo, apenas isso e nada mais. Se o jornalista quer pautar a sociedade e as suas instituições ele já tomou partido, e, como o termo explicita, partidas serão suas opiniões. Portanto, o mais correto é se filiar a um partido político, conquanto que não seja, todavia, o Partido da Imprensa, que não disputa voto e, por ser ousado e não se olhar no espelho, quer fazer da República Federativa do Brasil seu feudo, conforme sua vontade, fato que foi provado, reiteradamente, nas questões relativas à luta pela terra por parte do MST, nas questões concernentes às reivindicações trabalhistas e salariais dos trabalhadores dos setores público e privado, nas questões referentes às eleições para presidente, governadores e prefeitos e nas questões tangentes às crises políticas que derrubaram presidentes como Getúlio Vargas e João Goulart, bem como na questão que influenciou na derrota do candidato Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições presidenciais de 1989, bem como na tentativa de golpe contra o presidente Lula em 2005, além de ter perseguido, incessantemente, políticos da envergadura de Juscelino Kubitschek, Leonel Brizola, Luís Carlos Prestes, Miguel Arraes e até mesmo Ulysses Guimarães, muito menos palatável para o Partido da Imprensa do que Tancredo Neves.

O Partido da Imprensa combate tudo aquilo que possa dividir as riquezas deste País, no que tange à redistribuição de renda. Quase todos os programas sociais e econômicos apresentados no Brasil não tiveram o apoio da imprensa hegemônica. Além do mais, a imprensa combateu e combate ferozmente as políticas públicas independentes e desenvolvimentistas executadas por Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek, João Goulart, Luiz Inácio Lula da Silva e agora, de maneira dura, o governo da presidenta Dilma Rousseff. E isto é só o começo. O Partido da Imprensa vai recrudescer seus ataques a Dilma quando ele desistir, totalmente, de fingir apoio moderadíssimo à governante, para depois, evidentemente, voltar à carga total no que é relativo aos seus ataques ao Governo, ainda mais quando ficar claro quem vai ser o candidato da direita nas eleições para presidente da República em 2014.

Para se ter uma idéia da desfaçatez e da insensatez do Partido da Imprensa, ele combateu a criação da Petrobras, da Vale do Rio Doce, da CSN e das leis trabalhistas — a CLT. Em compensação, apoiou as tentativas de golpe em 1932, em 1938 e em 1954/1955, além de participar dos golpes militares de 1945 (“golpe branco”) e de 1964. A imprensa golpista sempre se aliou aos partidos conservadores, notadamente com a UDN de Carlos Lacerda, Eduardo Gomes e Juarez Távora, partido moralista e elitista, que recebia o apoio dos empresários e de parte da classe média de perfil conservador. Posteriormente, a UDN mudou a sigla e passou a ser conhecida como Arena no governo militar, depois PDS para, anos depois, virar PFL que, em 2007, finalmente, passou a se chamar Democratas — o DEM.

Como a direita brasileira tem no máximo 30% dos votos, tanto que sempre andou a reboque de partidos de centro e de centro esquerda, o DEM (PFL), por exemplo, aliou-se, em 1989, a Fernando Collor e a seu minúsculo PRN. Em 1994, teve de se aliar ao PSDB para chegar ao poder, com seu vice-presidente Marco Maciel, o que foi ratificado nas eleições de 1998. No período Lula, nos anos 2000, a agremiação conservadora continuou como vagão dos tucanos. Antes, em 1960, o DEM, que é a UDN, apoiou Jânio Quadros, que foi eleito presidente pelo pequeno PDC. Todavia, os udenistas não confiavam em Jânio, considerado um político independente, porque transitava pelos espaços da direita e da esquerda, o que não agradava os direitistas, que desde 1930 sonhavam assumir novamente o poder, como nos tempos da República Café com Leite. Jânio, tal qual o Collor, não “dialogava” com o Congresso.

Como se percebe, o DEM nunca teve força política para chegar à Presidência da República como partido hegemônico. Enfim, chegou ao poder em 1964, por meio de um golpe militar que derrubou o presidente trabalhista João Goulart, eleito constitucionalmente pelo voto direto. Naquele tempo o vice-presidente era eleito separadamente. Não existia a chapa vinculada. Todos esses fatos tiveram o apoio do Partido da Imprensa, que é empresarial e apoia e sempre apoiou políticas econômicas artificiais como o é o neoliberalismo, que fracassou e hoje até o FMI, guardião desse fracasso, avisa aos maus navegantes, como ele, que vai modificar seu processo de ajuda, de coordenação e de fiscalização das políticas públicas, econômicas e financeiras receitado aos países pobres e em desenvolvimento.

No Brasil, na América Latina, na Ásia e na África as receitas econômicas e financeiras do Bird e do FMI causaram problemas sociais tão graves que mesmo os governantes neoliberais dos países dessas regiões perceberam que não dava para continuar o processo de espoliação desses povos, sem que seus governos caíssem ou fossem derrubados. Mesmo assim, os conservadores, os direitistas do mundo empresarial e político, no Brasil leia-se DEM, Fenaban, Fiesp, agronegócios e, principalmente, Partido da Imprensa, continuaram a apregoar o que não deu certo, o indefensável e o que causou dor aos mais pobres, aos mais fracos e aos que não podem se defender.

O Partido da Imprensa, com seus profissionais bem pagos e com a cabeça feita por Wall Street e pelo Consenso de Washington de 1989, prosseguiram, de forma ridícula, sem ao menos ponderar suas palavras levianas, a apregoar um modelo econômico verdadeiramente contrário aos interesses da Nação até que, por intermédio de eleições, os defensores dessa política econômica burra e nefasta foram afastados do poder, tanto no Brasil quanto em muitos outros países. Não se compreende, até hoje, o que leva algumas elites a fazer gol contra. Mas se compreende que, ao contrário do que afirmam os gurus do capitalismo de mercado que estabelecem regras somente para os mais pobres e os mais fracos e dizem se preocupar em assegurar a efetivação de um estado de bem-estar social, que dignifique a pessoa humana, sabemos que o que importa à grande imprensa e a direita política do planeta é perpetuar os privilégios daqueles que fazem parte de sua classe social — os ricos e os muito ricos.

Há uma espécie de seres humanos que dá pena. Acha que riqueza é genética, é biologia. Quando na verdade a riqueza é um processo que envolve milhões, quiçá bilhões de pessoas que a produz. Não é uma questão biológica. É uma questão econômica e financeira que precisa, deve e pode ser calculada e equacionada no sentido de distribuí-la. Se dinheiro e bens materiais fossem parte de nossa biologia nasceriam com a gente e seriam conosco levados ao caixão. Não consigo entender como alguns jornalistas que se alimentaram adequadamente, que estudaram em boas escolas, que têm capacidade de discernir se tornaram tão pusilânimes, cínicos, dissimulados, covardes e mentirosos. Eles são um contra-senso em toda sua essência e a burrice em toda sua plenitude. Somente alguns advogados atingem a tanta incongruência.

A imprensa é parcial. Sua voz e seus canais de comunicação pertencem aos que controlam e dominam o mercado de capitais e os meios de produção, pelo simples fato de a imprensa ser o próprio, o espelho que reflete a imagem do sistema. Ela traduz os valores e os princípios do modelo econômico hegemônico. Ela é o principal e o mais importante tentáculo do sistema capitalista. Ela é a sua alma e a sua voz. Não há poder pleno sem o apoio da imprensa, para o bem ou para o mal. Seja qual for o poder, a imprensa não abre mão de manter os privilégios do segmento empresarial. Ela até compõe, mas ressalta seus interesses e resguarda os privilégios. Não há hegemonia de uma classe social sobre as outras sem o controle dos meios de comunicação. E é este processo, draconiano, que acontece no Brasil e na América Latina.


O acesso da maioria das populações ao crescimento social e ao desenvolvimento econômico acontece a conta-gotas, milenarmente. No caso do Brasil, secularmente. É como acontece em jogos de futebol, quando o time que está a ganhar passa tocar a bola, à espera de o tempo passar, à espera de o jogo terminar. Os barões da imprensa, como patrões seculares, querem o fim do jogo e para isso eles precisam pautar os poderes constituídos e, inclusive, não raramente, questionar cláusulas pétreas da Constituição, como, por exemplo, os capítulos voltados ao trabalho e aos meios de comunicação. Meia dúzia de famílias quer o controle total e irrestrito dos meios de comunicação. Meia dúzia de famílias brasileiras, ao representar o grande empresariado nacional e internacional, quer a flexibilização das leis trabalhistas, constituídas pelo estadista Getúlio Vargas, que se matou em 1954 para não ser derrubado, mais uma vez, pela UDN, pelos militares, pelo empresariado e pela imprensa. Getúlio teve de se matar para adiar o golpe militar por dez anos, o que ocorreu em 1964.

Para isso, os barões da imprensa contratam jornalistas de confiança. Os jornais criticam os cargos de confiança no âmbito governamental, mas não criticam seus cargos de confiança, pagos a soldos altos, para que certos profissionais façam o papel de defensores do status quo, do establishment, razão pela qual talvez tenhamos uma das elites mais cruéis e alienadas do mundo, totalmente divorciada dos interesses do povo brasileiro, há mais de cinco séculos. Tudo o que é feito em prol do povo, os homens e as mulheres de imprensa, os que ocupam cargos de mando, chamam de populismo. Mas tiveram a insensatez e a ignorância política em defender o neoliberalismo, que fracassou de forma inapelável e retumbante. Até mesmo jornalistas considerados experientes como o Renato Machado e a Renata Vasconcellos, do “Bom Dia Brasil” da TV Globo, saudaram, da forma mais imprudente e capciosa possível, o golpe sofrido, em abril de 2002, pelo presidente constitucional da Venezuela, Hugo Chávez, que foi, inclusive, absurdamente seqüestrado, com o apoio da CIA do governo de George Walker Bush, que se antodenominava o senhor da guerra.


Meu comentário não visa constranger o Renato Machado, até porque não o conheço. Cito apenas um fato real, de conhecimento público, notório e que ficou na memória e na retina de muitos brasileiros, porque a saudação ao golpe foi incrivelmente surreal, um despropósito. Renato Machado, de perfil político conservador igual a tantos outros jornalistas, apenas, talvez até inconscientemente, comemorou a queda, mesmo através da violência, de um homem constituído presidente, pois eleito pela vontade do povo. Machado simplesmente reflete o desprezo do Partido da Imprensa em relação aos interesses da sociedade, em relação às determinações e aos desejos da sociedade civil. Não há nenhuma surpresa. O Partido da Imprensa age assim, mostra-se assim, só que, muitas vezes, inversamente ao Machado, apresenta-se de forma dissimulada.

Renato Machado no dia seguinte à sua comemoração em referência ao golpe contra o presidente venezuelano apareceu visivelmente constrangido. Acho que ele não tinha dimensionado sua atitude. Sua imagem, pálida e assustada, como se tivesse levado um grande susto ou uma bronca deveria ser gravada pelas pessoas alheias ao jornal matutino da TV Globo, com a finalidade de ser levada às escolas de comunicação para servir de exemplo aos futuros jornalistas como NÃO se deve proceder ou conduzir sua profissão. Foi realmente lamentável. Mas não foi uma surpresa. O Partido da Imprensa trabalha assim. Saímos da ditadura militar para a ditadura da imprensa. Igualmente os meios de comunicação hegemônicos apoiaram o golpe de estado em Honduras, sem vacilar, inclusive criticaram, com veemência, por intermédio de suas manchetes, de seus colunistas e comentaristas, a decisão do Governo brasileiro de receber em sua embaixada o presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya. Empresários e militares hondurenhos efetivaram o golpe, com apoio do governo dos Estados Unidos. O Partido da Imprensa, aqui no Brasil, ficou entusiasmado. Desconfio que até hoje os próceres da imprensa estão a brindar o golpe de estado, e devem sonhar com o ano de 1964 — saudosamente.


Dentre os muitos erros perpetrados pelos militares, um dos maiores foi a censura aos meios de comunicação. E por quê? Porque hoje, no regime democrático, a imprensa se recusa a ser regulamentada como acontece com outros setores da sociedade e, por que não, do mercado. Ela usa como argumento que criar, por exemplo, o Conselho Federal de Jornalismo é tentar censurar a imprensa, o que não é verdade. Criar o Conselho é regulamentar os meios de comunicação, que não podem deixar de ser fiscalizados, como o são os juízes, os médicos, os advogados, os professores, os arquitetos e engenheiros, os economistas, os contadores, os políticos etc. etc., por intermédio de seus órgãos de classe profissional.

Para evitar a criação do Conselho Federal de Jornalismo e de uma política que funcione como marco regulatório para os meios de comunicação, o Partido da Imprensa usa como argumento, há muito tempo surrado, que tentar regulamentar a imprensa é censurá-la, como ocorreu na ditadura militar. A verdade é que os barões da imprensa e seus jornalistas de confiança não querem a democratização dos meios de comunicação, porque não querem responder, como os outros profissionais, pelos seus erros, muitas vezes exemplificados em calúnias, difamações, omissões, distorções e manipulações das informações noticiosas, além da clara intromissão no processo político brasileiro, ao tomar partido de determinado candidato, geralmente de perfil conservador e elitista.

Além disso, extinguiram a Lei de Imprensa, sem antes, no entanto, criarem instrumentos que a regulamente, como, por exemplo, a Ley dos Medios aprovada na Argentina. Absurdo dos absurdos é deixar uma imprensa, uma mídia de passado golpista e mercantil sem um marco regulatório. A presidenta Dilma não pode e não deve deixar de regulamentar e criar regras para o setor dos meios de comunicação de perfil empresarial e comprometido com os interesses geopolíticos dos Estados Unidos e com o grande empresariado nacional e internacional. Uma presidenta trabalhista como a Dilma jamais deveria vacilar quanto à elaboração e aprovação de uma Ley dos Medios para o Brasil e o seu povo trabalhador. Seria uma séria imprudência. Lembremo-nos de Getúlio Vargas, João Goulart, Leonel Brizola e do presidente Lula, todos perseguidos pela imprensa privada, de forma dura e desumana. Dilma sabe disso. Ela fez carreira política no berço do trabalhismo brasileiro, que é o Estado do Rio Grande do Sul, e viu o presidente Lula comer o pão que o diabo amassou durante oito anos.

Não é necessário ser um especialista em “assuntos de imprensa” para perceber que ela é um desastre em relação aos interesses da sociedade. Ditatorial, raivosa e vaidosa não mede conseqüências para fazer do processo político brasileiro uma novela de má qualidade textual, cujo objetivo é somente a manchete, chamariz comercial para a imprensa vender e ganhar muito dinheiro, mesmo se for com o linchamento moral de terceiros, muitos deles, depois comprovado, sem culpa no cartório.

Sua atuação é incompetente, porque, sistematicamente, não tem ouvido nenhuma das partes implicadas ou envolvidas em quaisquer fatos, mas sim ouvido a si mesma, por meio de suas deduções e de seu raciocínio ardiloso, intelectualmente desonesto, que visam confundir o público e assim garantir seus interesses. Por tudo isso, o Partido da Imprensa é contra qualquer criação de órgão que possa acompanhar seus passos, como o Conselho Federal de Jornalismo e o Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3). Além do mais, os barões da imprensa se recusaram a participar da Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), realizada em dezembro de 2009, que estabelece novo modelo para o setor, que atualmente é um monopólio de meia dúzia de famílias, que combatem os avanços sociais da sociedade brasileira. O documento elaborado no evento vai ser analisado e avaliado pelos poderes constituídos, para depois se transformar ou não em lei. Os empresários proprietários da imprensa e da mídia comercial não querem debater e negociar nada. Querem que as coisas fiquem como estão, o que não será possível, ainda mais que Dilma Rousseff venceu as eleições para presidente em 2010. Evidentemente que alguma coisa vai mudar.

A arrogância e a prepotência de meia dúzia de famílias que controlam os meios de comunicação no Brasil não favorecem a democratização da imprensa, o que impede que ela, de fato, trabalhe em benefício do desenvolvimento social do povo brasileiro, em vez de ficar a distorcer realidades ou criar fatos, muitos deles sem fundamento, mas, contudo, propositais, pois a finalidade é confundir a sociedade e, conseqüentemente, proteger ou concretizar seus interesses e do grande empresariado, geralmente financeiros e econômicos. Essas atitudes, sobremaneira, prejudicam as atividades daqueles que são incumbidos pelo povo para administrar os três poderes.

A imprensa quer falar pelo povo e representá-lo, mas não disputa eleições e não concorre a cargos públicos. Ela não tem voto. A imprensa é tão arrogante e ignorante que confunde opinião pública com opinião publicada. A imprensa publica e opina, por meio de matérias combinadas, de editoriais, de articulistas e de colunistas. Por isso, sua opinião é publicada. Ela paga a profissionais para publicar suas opiniões sobre determinado assunto. Por sua vez, a opinião pública é feita, é realizada e é concretizada por intermédio do voto. Portanto, o voto é a opinião pública. Palavra e opinião de jornalista ou de quaisquer outras pessoas que atuam em outros segmentos é opinião publicada. Então, vamos ver se a imprensa entendeu: 1) jornalista = opinião publicada, que, por sinal, tem valor. 2) povo = opinião pública = o voto, que, por sinal, tem muito mais valor. É isso aí.

quinta-feira, 28 de junho de 2012

A Medicalização da Vida



Observa-se na sociedade contemporânea uma busca desenfreada por explicações biológicas, fisiológicas e comportamentais que possam dar conta de diversos tipos de sofrimento psíquico, dentre estes, os mais frequentes são a ansiedade, estresse, depressão, síndrome do pânico, transtorno bipolar e fobias. Todos muito divulgados na mídia através de reportagens e documentários que pretendem ajudar os leigos a identificar os principais sinais e sintomas de seu mal estar, contribuindo assim para que muitos pacientes cheguem ao consultório buscando apenas uma validação da hipótese diagnóstica que obteve através de algum site.

Nesta busca por um alívio imediato dos sintomas, constata-se que cada vez mais pessoas depositam sua confiança em receitas rápidas que possam diminuir o mal estar sem se preocupar em buscar um sentido para este sofrimento. A medicalização da vida e do sofrimento tornou-se uma prática comum e na atualidade tornou-se corriqueiro ir a uma consulta e sair com uma receita em mãos. Segundo Roudinesco (2000) há um pagamento do sujeito, pois seja qual for o sintoma, sempre haverá um medicamento a ser receitado:
Cada paciente é tratado como um ser anônimo, pertencente a uma totalidade orgânica. Imerso numa massa em que todos são criados à imagem de um clone, ele vê ser-lhe receitada à mesma gama de medicamentos, seja qual for o seu sintoma. (ROUDINESCO, 2000).

O grande perigo da situação descrita acima é que se cria uma perspectiva totalizadora do ser humano, na qual se pretende atribuir todos os problemas vivenciais, emocionais a uma explicação orgânica e, especialmente, genética. Assim, difunde-se a idéia de que existe um gene que poderia explicar o alcoolismo, as doenças mentais e a infelicidade, fazendo com que hipóteses duvidosas sejam divulgadas pela mídia como fatos comprovados (Leite, 2011).

Explicar e reduzir a experiência humana através de um saber totalitário, de categorias fechadas e limitadas, CID- 10 e DSM-IV, que oferecem explicações prontas para determinados comportamentos diminui o real do sofrimento e a angústia por não saber a razão deste sofrimento. Assim, percebe-se atualmente uma grande adesão a estas formas de explicação que reduzem e até mesmo impedem o homem de construir através de uma experiência particular e subjetiva um significado para seu sofrimento. (idem).

Além da exacerbada carga medicamentosa prescrita aos adultos, uma constatação ainda mais preocupante é o aumento da medicalização da infância. Atualmente observa-se que crianças e adolescentes que apresentam comportamentos e características de personalidade que diferem dos considerados e catalogados como normais são frequentemente enquadrados em categorias nosológicas e assim rotulados como depressivos, portadores de TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e/ou Hiperatividade) ou de TDO (Transtorno Desafiador Opositor). Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), somente entre 2002 e 2006, a produção brasileira de metilfenidato, medicamento utilizado para o tratamento do TDAH cresceu 465% e as vendas saltaram quase 80% entre 2004 e 2008.

Cabe esclarecer que os psicofármacos, quando prescritos de forma criteriosa e responsável, tornam-se um importante aliado na luta contra o sofrimento humano, mas de forma alguma se deve restringir o tratamento apenas a uma resposta medicamentosa.

Na contramão destas receitas instantâneas, encontra-se a psicanálise. Há mais de cem anos, através da escuta de pacientes histéricas, Freud descobriu que os sintomas apresentados por estas pacientes não eram decorrentes de nenhuma lesão orgânica, mas que estes possuíam um sentido, um significado e estavam relacionados às experiências vivenciadas por estas pacientes.

Ainda hoje a psicanálise acredita que simplesmente extinguir o sintoma é silenciar o sujeito, pois o sintoma representa a única possibilidade encontrada por esse sujeito de expressar algo insuportável, para o qual ainda não foi possível construir nenhuma significação.

Assim, a psicanálise propõe uma experiência subjetiva na qual o sujeito construirá um significado para seu sofrimento, seu sintoma. Sua regra fundamental é a associação livre, que consiste em que o paciente fale livremente sobre seus pensamentos. Através deste método de investigação busca-se essencialmente evidenciar o significado inconsciente das palavras, das ações, das produções imaginárias (sonhos, fantasias, delírios, atos falhos) de um sujeito. Desta forma, o sujeito poderá elaborar situações traumáticas, esclarecer conflitos e ressignificar questões dolorosas.

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"Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso. 
Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro”.
Clarice Lispector.

sábado, 16 de junho de 2012

“Precisamos democratizar o elitismo”



Reproduzido do Suplemento Literário de Minas Gerais, edição especial “Reflexões sobre o jornalismo cultural”, Belo Horizonte, 2012, pelo Observatório da Imprensa

O jornalista Sérgio Augusto nasceu em 25 de janeiro de 1942, no bairro de Santa Teresa, no Rio de Janeiro. Publicou sua primeira crítica de cinema, profissionalmente, na Tribuna da Imprensa, em novembro de 1960. Com mais de meio século de atividade como crítico, repórter, redator e editor, participou, não por acaso, dos momentos mais importantes das mais importantes publicações do país, como os jornais Correio da ManhãJornal do Brasil e Folha de S. Paulo,nas revistas O Cruzeiro e Veja e nos semanários alternativosPasquim e Opinião. Não se pode esquecer, ainda, suas colaborações para a Senhor (a revista das revistas),Diner’s e Leia Livros. Desde 1996 escreve para o Estado de S. Paulo.
Em todas essas publicações o jornalista deixou a marca de uma inteligência sofisticada, entendendo a cultura de um modo ampliado, sem que nenhuma fronteira o impeça de falar de livros, filmes, discos, acontecimentos, enfim, tudo aquilo que levou certa vez o poeta Fernando Pessoa a afirmar a necessidade da arte em um mundo civilizado, pois “só a vida não basta”.
Dá prova desse interesse expandido o amplo arco de assuntos que perpassam esta entrevista, feita pore-mail. A maioria das perguntas é motivada pelos ensaios de jornalismo cultural reunidos em Lado B(Record, 2001) e As penas do ofício (Agir, 2006). No primeiro, Sérgio Augusto escolheu textos lançados anteriormente, entre 1997 e 2001, em duas publicações, a — em suas próprias palavras — “séria, chique à beça, mensal e paulista” Bravo!, e a “anárquica, escrachada, semanal e carioca” Bundas. O segundo livro reserva espaço apenas para textos da revista de São Paulo, de 2001 a 2005.
Com exceção de Botafogo – entre o céu e o inferno (Ediouro, 2004), seus outros livros também são voltados para momentos luminosos do universo cultural: Este mundo é um pandeiro (Cia das Letras, 1989),Cancioneiro Jobim (Casa da Palavra, 2000), Cancioneiro Vinicius de Moraes/Orfeu (Jobim Music, 2003) e O Melhor do Pasquim (Desiderata (2006-2009). O mais recente é E foram todos para Paris (Casa da Palavra, 2011).

No final do ano passado você lançou E foram todos para Paris(Casa da Palavra), em torno dos pontos turísticos da capital francesa relacionados à cena artística e cultural. A França exerceu uma influência marcante sobre a cultura brasileira (especialmente a literatura) nas primeiras décadas do século passado. A partir de determinado momento, contudo, a cultura americana se impôs, com sua rica diversidade (negros, judeus, latinos, árabes e orientais), o que prevalece até hoje. Para você, como essas influências afetaram o jornalismo cultural praticado no país?
Sérgio Augusto– No mundo inteiro essas prevalências ocorreram. Na Belle Époque, a cultura francesa ditava as modas, impunha gostos, com mais intensidade em países periféricos como o Brasil. O colonialismo cultural então falava francês. O Rio de Janeiro modernizou-se seguindo paradigmas parisienses. O prefeito Pereira Passos foi o Barão Haussmann carioca. Ele não apenas limpou e saneou a cidade como fez dela uma Paris-sur-Mer, uma miragem de progresso e civilidade. Nossas elites imitavam os franceses—e também os ingleses—em quase tudo: nas escolas, nos clubes fechados, no interesse por corridas de cavalo, as crianças aprendiam francês, às vezes antes mesmo do português, liam livros impressos em Paris, tinham lições de boas maneiras ministradas por governantas inglesas, nossos escritores devoraram a literatura francesa e as publicações culturais e mundanas impressas em Paris.
Nossa ligação com a França e sua cultura vem desde meados do século 16 e atingiu seu ápice com a Inconfidência Mineira, alimentada pelos ideais libertários dos Enciclopedistas franceses, com o Romantismo, o Positivismo, o Modernismo, o Existencialismo, e estendeu-se até a Nouvelle Vague, inspiradora do Cinema Novo. Houve um tempo em que as livrarias, as confeitarias, as casas noturnas e as salas de cinema tinham nomes franceses. Uma de nossas primeiras revistas de cultura, Nytheroy, lançada em 1836, era editada em Paris pelo poeta carioca Gonçalves de Magalhães, Visconde do Araguaia.
Depois da Segunda Guerra Mundial, a cultura americana, com toda sua modernidade, sua diversidade, seu charme, mais a força econômica do dólar e o status de lingua franca que o inglês adquiriu, ocupou o que lhe parecia de direito após a derrota do nazismo. Os soviéticos também foram fundamentais para a destruição do 3º Reich, mas nunca conseguiram impor sua cultura em escala mundial porque não tinham as mesmas armas de sedução dos americanos. Os russos não tiveram Hollywood, não usufruiram de um melting pot cultural com negros e judeus, não produziram um Cole Porter, um Hemingway, um Armstrong, um Sinatra, uma Marilyn, um Elvis Presley, nem revistas como TimeEsquire e New Yorker, e foi com esses trunfos que os americanos varreram os franceses de nosso horizonte cultural.
O sociólogo Zygmunt Bauman definiu nosso tempo como “inóspito à educação”. Em 2001, ao definir o Brasil como “uma nação de videotas”, você prescreve que, para para compensar essa lavagem cerebral e espiritual imposta pela TV há um caminho: “Educar, inocular ou pelo menos atenuar os efeitos do soma [isto é, o soro da alegria de O Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley], popularizar outras formas de entretenimento e fontes alternativas de prazer e oxigenação cerebral, e estimular o seu consumo, para que a fleixibilidade mental não seja um privilégio de poucos”. Você arremata com essa frase definitiva: “Precisamos democratizar o elitismo”. Mas, de modo prático, como se pode fazer isso? Já se percebe um movimento das TVs pagas de privilegiar filmes dublados em detrimento do legendado, por exemplo.
S. A. – Na verdade, a única coisa que se democratizou por aqui desde a implantação do Plano Real, e com maior ímpeto a partir do governo Lula, foi o acesso das classes C e D aos bens de consumo cultural. Isso é bom do ponto de vista social e econômico, mas configura uma evolução meramente quantitativa, boa para as vendas e índices de audiência, mas nociva para uma efetiva evolução mental e espíritual da população, na medida em que, para usar uma metáfora gastronômica, a presuntada se impõe ao patê cultural. Chamei atenção para esse pacto faustiano com o mefistófeles do consumismo 15 anos atrás, quando, em plena era FHC, a cultura, já órfã de gênios, emasculada pela supremacia mercadológica e desassistida por uma mídia submissa aos mais rasteiros interesses da indústria cultural, começou a ser amplamente dominada pelo pagode, pela vulgaridade, pela cretinice satisfeita, tendo como paradigmas a Carla Perez e o Tiririca. Só os paradigmas mudaram, substituídos por avatares de igual perfil populista. A TV Globo virou uma Record com mais recursos e mais telespectadores cativos. A ordem, lá e por toda parte, é baixar o nível. A televisão a cabo é uma vergonha, da programação aos pacotes fechados impostos aos clientes, dos intervalos entupidos de comerciais aos filmes dublados, que, em certos dias, tomam conta dos canais. O filme dublado é o suprassumo do nivelamento por baixo, da subserviência ao analfabetismo, do desrespeito à criação alheia—e também, não nos esqueçamos, aos deficientes auditivos.
Muito embora os jornalistas tenham hoje à disposição todo o acervo acumulado em séculos, assistimos a um rebaixamento do nível de conhecimento. Há uma perda de parâmetros, de referências. Quando morreu o diretor John Hughes, um repórter da Folhaclassificou seu filme “Curtindo a vida adoidado” de obra-prima, por exemplo. Como você avalia essa situação? Você mesmo escreveu: “Sou de um tempo em que nenhum repórter, por mais jovem e tímido que fosse, deixaria passar em brancas nuvens tolices ditas hoje impunemente até mesmo de reconhecido valor”. Para exemplificar, você fala do caso de Carlinhos Brown, que numa entrevista recusou-se a reconhecer Mozart como um clássico pelo simples fato de conhecer apenas uma parte de sua obra.
S. A. – É constrangedor. Qualquer filme com mais de 20 anos agora é tachado de “clássico” ou “obra-prima”. Quando, faz tempo, o filme Desirée, o Amor de Napoleão passou pela primeira vez na televisão, o “Caderno B” do Jornal do Brasil referiu-se ao abacaxi como “uma obra-prima com Marlon Brando”. Putz! Nem a mãe de Henry Koster, diretor do filme, o tinha em tão alta conta. Volta e meia, quando morre um figurão do cinema, seus obituários nos agridem com distorcidas observações do gênero, supervalorizando o que nunca teve mérito. Não sei o que é pior, se a reverência descabida, ditada pela ignorância e a insegurança, ou a detonação gratuita, falsamente iconoclasta, de filmes antigos só por serem antigos, também típica das novas gerações. A culpa maior é dos editores que aceitam trabalhar com mão de obra pouco qualificada. O cinema sofre mais por ser a casa-da-mãe-joana das artes ou do entretenimento. Como todo mundo vê filmes desde criancinha, acredita-se que qualquer um esteja apto a criticar um filme. Com a ópera, a música erudita e o balé, o buraco é mais embaixo, os amadores, os curiosos e os aficionados tout court não têm vez.
Carlinhos Brown, numa entrevista à Playboy, disse que se recusava a reconhecer Mozart como um clássico por ter ouvido apenas uma parte de sua obra. Mesmo que só tivesse ouvido duas peças de Mozart na vida, o percussionista baiano não tinha por que submeter um conceito universalmente aceito—Mozart é um clássico—ao arbítrio de sua insuficiente cultura musical.
O advento de sites como o Youtube, que fornece uma infinidade de informação visual disponível a qualquer um que tenha acesso à internet, cria uma nova relação com a memória. Posso ler uma crítica sobre um CD e imediatamente acompanhar essas músicas, saber mais sobre quem a compôs. Hoje é possível acessar o passado de uma maneira sem precedentes. Antes, o passado estava em lugares específicos – bibliotecas, coleções de revistas antigas, microfilme, as informações eram mais difíceis de se conseguir, tal como observa o crítico britânico Simon Reynolds Retromania (faber & faber). Para você, quais as implicações desse acesso facilitado ao passado?
S. A. – Entre outras coisas, a obsolescência de elefantes como eu, que agora também posso me dar ao luxo de não me lembrar de nada que não esteja ao alcance de qualquer um na internet. Passamos a exercitar menos a memória, o que é cômodo mas não é saudável; ganhamos espaço em nossos arquivos “analógicos”, jogando fora recortes e outros papéis que agora são armazenados de maneira mais econômica, e até nas nuvens. Mas a informação pura e simples pouco ou nada vale se você não sabe como utilizá-la, vale dizer, relacioná-la com outras de forma eficaz, inteligente, produtiva. É preciso saber transformar a informação em conhecimento, em saber. O Google, a Wikipédia e o IMDB facilitaram nossa vida, agilizaram nosso trabalho, transformaram qualquer um de nós em sabichão, em polímata, aliviaram a barra dos estudantes (que agora dispõem de cola digital, online), mas, a exemplo da substituição da pena pela máquina de escrever, não melhoraram a qualidade da nossa produção intelectual.
Quando o Chico Buarque lançou seu disco mais recente, falou: “Eu achava que era amado, porque as pessoas iam ao show, me aplaudiam e, na rua, me cumprimentavam. Descobri, na internet, que sou odiado. Agora entendi as regras do jogo”. Quais são as regras do jogo agora, na sua opinião?
S. A. – A internet é um território sem lei, logo sem regras, onde as vaias, os insultos e as bravatas podem se proteger no anonimato, se esconder atrás de pseudônimos. Chico, como todo artista de sucesso, sempre despertou inveja e ressentimentos, só que os invejosos e ressentidos não tinham coragem de extravasar seus baixos sentimentos às escâncaras. Quando passaram a dispor de um dispositivo como a internet, abriu-se a caixa de pandora.
Você trabalhou no Correio da Manhã. Era chegar à redação e deparar-se, em pessoa ou em textos, com Otto Maria Carpeaux, Carlos Heitor Cony, Carlos Drummond de Andrade... Dessa geração, quem você considera importante para sua formação? Vale dizer que você escreveu sobre o Carpeaux chamando-o de nosso “último renascentista”. O poeta Affonso Ávila disse que o Brasil deve ser considerado Antes e Depois de Carpeaux.
S. A. – Faltou acrescentar à lista Antonio Callado, José Lino Grünewald e Antonio Houaiss. Trabalhavam todos numa sala chamada de Petit Trianon, que ficava a uns 3 metros da minha mesa, à direita de quem entrava na redação. Eu não saía de lá. Era um noviço com 19 para 20 anos de idade, imagine o que aquela convivência significou para mim. Meus três ou quatro anos de Correio da Manhã valeram por um curso universitário. Se juntarmos todas as redações de jornal ou revista de hoje ainda ficaremos a anos-luz daquela. A figura mais importante para minha formação, embora não citado por você, foi o crítico de cinema Antonio Moniz Vianna, meu guru desde os 15 anos, quando o li, por acaso, pela primeira vez. Mesmo sem entender a maior parte do que li, dada a minha falta de repertório, fiquei fascinado, e disse para mim mesmo: é isso que eu quero ser na vida. Herdei a coluna do mestre quando ele assumiu a chefia de redação do Correio, e me senti como se sentiria um pároco de aldeia subitamente convidado pelo papa para tomar seu lugar na Santa Sé.
Carpeaux foi a pessoa mais culta que eu conheci e que mais coisas me ensinou. Só não entendia de futebol e música popular. Fazíamos testes de brincadeira, para avaliar sua erudição, e ele passava em todos. Ainda trabalhei com ele, Callado e Houaiss nas enclopédias Barsa e Mirador. Foi uma figura fundamental para o nosso processo civilizatório.
Você foi preso pela ditadura uma vez, em 29 de fevereiro de 1972 (ano bissexto como este agora). Sete anos depois, foi enquadrado na Lei de Segurança Nacional por conta de “Mar de lama”, reportagem sobre casos de corrupção no governo Geisel. Você depois descobriu que os órgãos de segurança mantinham um dossiê a seu respeito desde novembro de 1965, quando trabalhava no Jornal do Brasil. Você pode falar um pouco dessa experiência? De que modo ela te afetou (ou não)?
S. A. – Foi chato, mas não tirou sangue. A turma do Pasquim vivia debaixo de censura e sob constante ameaça de uma temporada nos porões da ditadura, e vários de sua equipe original passaram dois meses na cadeia, na Vila Militar, sem uma acusação formal, sem processo. Minha prisão, em fevereiro de 1972, justo no aniversário do Jaguar, resultou de um acúmulo de equívocos e coincidências. Preparávamos uma edição especial sobre Ipanema, Miguel Paiva fora escalado para entrevistar Ricardo Amaral em seu bunkerna Lagoa Rodrigo de Freitas, e Bruno Barreto faria as fotos. Bruno, estagiando como fotógrafo do jornal, tinha só 17 anos. Como fazia um dia lindíssimo e eu, cuidando da edição do número, não tinha nada para fazer naquele início de tarde, resolvi acompanhá-los. Fomos no Opala branco que o Paulo Francis vendera ao jornal antes de se mudar para Nova York, no ano anterior. Miguel Paiva ao volante. Quase no estacionamento da Lagoa, fomos parados por uma blitz. A polícia buscava um Opala branco envolvido num assalto a banco pela manhã, no centro da cidade. Assalto por militantes da luta armada. Talvez nos tivéssemos livrado da blitz se os documentos do carro estivessem no porta-luvas e Miguel não trouxesse em sua bolsa uma carteira falsa de estudante, que usava para pagar meia entrada nos cinemas. Resultado: fomos levados para a 14ª Delegacia, no Leblon, e depois para o DOPS, onde ficamos presos até o fim da noite. Havia no DOPS um dossiê a meu respeito, por ter assinado um manifesto contra a prisão dos “18 do Glória”, em 1965, mediado um debate sobre o filme Terra em Transe, no Museu da Imagem e do Som, em 1967, e constar da caderneta de endereços do Fernando Gabeira, que havia sido meu colega no Jornal do Brasil, participara do tal debate sobre o filme do Glauber, e, last but not least, ajudara a raptar o embaixador americano. Por uns tempos precisei da autorização da Polícia Federal para viajar ao exterior. O enquadramento na Lei de Segurança Nacional me levou a um tribunal militar, mas afinal não deu em nada. O veredito demorou tanto a sair que acabei beneficiado pela Lei da Anistia. Resumindo: sofri apenas apreensão e constrangimentos durante a ditadura. Ali por volta de 1974 era censurado previamente nos três veículos para os quais escrevia: PasquimVeja e Opinião. Cheguei a brincar com o Millôr, que escrevia nos dois primeiros, mas não no Opinião: “Sou eu, não você, o jornalista mais censurado do país”.
Em um de seus textos você lembra o coronal Darci Lázaro, que ameaçou: “Se essa história de cultura vai-nos atrapalhar a endireitar o Brasil, vamos acabar com a cultura durante trinta anos”. Qual o tamanho do estrago que o regime militar provocou na cultura brasileira?
S. A. – O estrago foi enorme, como é sabido e está exaustivamente documentado em livros, como também é fato que quando chegamos a 1994 pudemos olhar para trás e dizer: “Já se passaram os 30 anos dados pelo coronel Darcy Lázaro e sua ameaça não se cumpriu”. O único Darcy daquele tempo que entrou, gloriosamente, para a história do Brasil foi o Darcy Ribeiro, odiado por seu xará fardado, que hoje é apenas um estande de tiro em Brasília, preito irrelevante de que só tomei conhecimento consultando o Google.
Escrevendo sobre Art Spiegelman, você lembra que ele levou ao editor da New Yorker, David Remnick, uma série de quadrinhos sobre a experiência de se viver numa cidade ameaçada simultaneamente por Bush e Osama bin Laden (no Brasil, saiu com o título À sombra das torres ausentes, pela Companhia das Letras). Na sequência, Art pediu demissão e publicou a série em outro jornal. A partir desse episódio, pergunto: qual o papel e a importância de um editor quanto aos critérios e valores que norteiam uma publicação? Lembro ainda aquela história do Paulo Francis, que publicou um texto criticando atuação da atriz Tônia Carrero. Depois, afirmou que, se o editor tivesse conversado com ele, talvez não publicasse a crítica.
S. A. – O editor é ou deveria ser o superego de qualquer publicação, seja ele o dono do negócio ou apenas seu mais graduado intermediário. O ideal é que seja o mais capacitado, experiente e sensato da redação ou ao menos dê essa impressão. Afinal, são desses atributos que deriva sua ascendência. David Remnick é um excelente editor mas é difícil julgar se exagerou na dose de cautela ao vetar os quadrinhos do Spiegelman. Todo editor tem seu dia de censor; faz parte da função. No Brasil houve e continua havendo editores que, se trocados pelo contínuo, ninguém notaria a diferença.
O capitalismo global cometeu um erro fatal: modelar as diversas economias mundiais por um único padrão, sem levar em conta suas diferenças econômicas e culturais. Essa é uma avaliação de John Gray, no livro Falso Amanhecer(Ed. Record, no original, “False Dawn”), sobre o qual você escreveu. De que maneira essa estandardização se faz presente no jornalismo cultural praticado no Brasil hoje?
S. A. – Nosso jornalismo cultural já foi um dos melhores da imprensa mundial. Nos anos 80, Matinas Suzuki Jr., que então editava a “Ilustrada”, o caderno cultural e de variedades da Folha de S. Paulo, ousou proclamar essa excelência nas páginas do jornal. O “Caderno B” do Jornal do Brasil, desde que surgiu, no final dos anos 50, até os anos 80, foi um farol de inteligência e inventividade. O mesmo se diga do “Quarto Caderno” do Correio da Manhã, editado pelo Francis na segunda metade dos anos 60. Nas duas últimas décadas, todos os “segundos cadernos” ficaram parecidos, excessivamente caudatários da indústria cultural, como se pautados por uma central de divulgadores. O “Caderno 2” do Estado de S. Paulo é, hoje, uma honrosa exceção. E não sou só eu que assim pensa.
Ao mencionar o Instituto Moreira Sales, com ações no Rio, em São Paulo e em Poços de Caldas, você pergunta: “Quantos institutos e fundações culturais patrocinados por sobrenomes ilustres existem aqui?” Por que os nossos ricos não são como os ricos dos EUA, que fazem filantropia pelo menos para conquistar status?
S. A. – Faltam-lhes tradição nessa forma de acumulação do chamado capital prestígio. A formação socioeconômica do país nos condenou a ter mais empresários e argentários que preferem guardar quadros em cofres e comprar cavalos e jatinhos particulares do que obras de arte para usufruto público. Contam-se nos dedos os que nos legaram coleções, museus, bibliotecas e fundações. Nossas leis de incentivo fiscal, além de recentes em relação às de outros países, nasceram cheias de furos, permitindo que determinadas instituições criassem fundações que funcionam mais como apêndices do departamento de marketing daquelas corporações.
Não mais do que 10 ou 15 gigantes da mídia decidem o que vamos ver e ouvir. São eles que dominam a indústria do entretenimento e da informação. Como resistir à homogeneização cultural?
S. A. – Não sei. Talvez se os editores de jornais e revistas fizessem um pacto para enfrentar juntos a tirania da mesmice, repudiando a homogeneização, alguma mudança poderia ocorrer. Mas isso é umwishful thinking, uma utopia. A concorrência ficou muito acirrada, sempre uma ou mais publicações romperiam o acordo para obter algum tipo de vantagem sobre as demais, e assim iludir-se de que terão mais tempo de vida. Para enfrentar a homogeneização é preciso, antes de mais nada, ter ousadia e condições para ser heterogêneo.
George Orwell cunhou a expressão “Thought Police” (polícia do pensamento), a propósito do controle de ideias nas ditaduras comunistas. Parece que eclodiu uma nova era desse controle, através do “politicamente correto”. Para você, o politicamente correto de hoje têm o mesmo sentido das patrulhas ideológicas dos anos 70?
S. A. – O politicamente correto é o primo rico e estrangeiro da patrulha ideológica; é um fenômeno globalizado, uma pestilência mundial propagada pelos americanos, sem prazo de validade, portanto mais daninho.
Sei que você trabalhou com editor no segundo caderno do Correio da Manhã. Em outra(s) publicação(es) também exerceu esse ofício? Pode falar um pouco dessa experiência? Você se sentia melhor como repórter, ensaísta ou editor?
S. A. – Fui alçado à condição de editor quando o Correio da Manhã passou a ser estrangulado economicamente por ter-se voltado contra o regime militar depois do primeiro Ato Institucional, em 9 de abril de 1964. Só uma situação anômala como aquela pode explicar a entrega do “Segundo Caderno” a um menino de 22 anos de idade e apenas quatro de redação. Foi maravilhoso enquanto durou. Minha liberdade era total. Não havia, naquele tempo, a obrigação de cobrir todos os eventos culturais da cidade; se o show ou o filme estreante era bom, ganhava matéria e crítica; se não era, dava-se outra coisa. Não nos submetíamos à agenda da semana, nem as editoras de livros impunham as datas em que seus grandes lançamentos tinham de ser resenhados, como há tempos acontece. Não havia o servilismo de agora. Até por isso os segundos cadernos dos jornais não pareciam clones ou covers uns dos outros, como os de hoje. Uma vez gastei a primeira página com cinco fotos espetaculares sobre leões na África, sustentadas por um texto meu sobre tudo que sabia e aprendi correndo sobre o rei dos animais, sem exclusão de Androcles e o leão da Metro, claro, e, à falta de um título que me satisfizesse, declinei na vertical o substantivo leão em latim: “Leo, leonis, leoni, leonem, leo, leone”. Fez o maior sucesso, sobretudo pelo inesperado.
Em O frenesi do furo, você afirma que, por volta de 1985, “a Folhadeu ao caderno de cultura o mesmo status jornalístico da política e da economia. Foi sem dúvida um avanço, mas algumas deformações ocorreram. Nenhuma tão desatinada quanto o culto ao furo, à exclusividade” (2000). Você acha que ainda hoje essa seja a principal deformação?
S. A. – Acho. E talvez tenha até piorado. Sei de escritores que morrem de medo que algum jornalão publique uma resenha ou uma matéria, mesmo favoráveis, sobre seu livro, antes dos concorrentes, pois isso, quase certamente, é uma sentença de morte, uma condenação ao silêncio ou, na melhor hipótese, a um cantinho de página.
No Pasquimvocê tinha uma página de crítica da mídia duas vezes por semana. Há um episódio em que, nesta seção, você criticou o próprio jornal e foi demitido. Pode falar sobre isso? O que aconteceu realmente? Qual foi a sua crítica?
S. A. – A página, intitulada “É isso aí”, só saía uma vez por semana porque o Pasquim era um semanário. Tomei as dores do Mino Carta, que, por causa de uma reportagem maldosa do Wagner Carelli sobre a esquerda festiva de Ipanema, publicada na IstoÉ, dirigida pelo Mino, foi ferozmente criticado e gozado noPasquim pelo Ziraldo, pelo Ivan Lessa e não sei mais quem. Ora, se eu criticava o resto da imprensa, por que haveria de livrar a cara do Pasquim? Jaguar me demitiu. Por carta! Alegou que eu “não estava vestindo a camisa” do jornal. Ziraldo alegou que ele, Jaguar, estava de porre quando me demitiu; tentaram voltar atrás, mas não cedi e saí, no final de 1979. Depois fizemos as pazes, mas nunca aceitei voltar ao jornal.
Quando você saiu da Folha, em 1996, o Francis disse que sua saída marcava o fim de uma época do jornalismo cultural. E terminava assim: “Acabou o asfalto”, tal como registrado em entrevista para o livro Pós-tudo, 50 anos de cultura na Ilustrada(Publifolha). Curiosamente, essa sua saída coincide com a ascensão das mídias digitais, possibilitada pelo avanço da internet. Nesses quase quinze anos, quais as principais mudanças que afetaram o jornalismo cultural, em sua opinião?
S. A. – Exagero do Francis. Mas a frase é maravilhosa como epitáfio para o modelo de jornalismo no qual Francis e eu fomos criados. O computador foi, para mim, um bálsamo; a humanidade deveria ter saltado do cinzel direto para o computador sem passar pela máquina de escrever. A internet é um luxo, agiliza o serviço, mas a qualidade do jornalismo cultural não melhorou depois do seu advento. Como podia melhorar com tantos palpiteiros sem qualificação (e sem um superego) online? Se e quando inventarem um programa com várias opções de lead para qualquer texto, a qualidade cairá ainda mais, aí, sim, teremos sacramentado a homogeneização.
Nos jornais impressos europeus e americanos predomina a publicação de suplemento ou revista semanal de cultura. No Brasil, ganhou forma o caderno diário. Por que acha que o modelo americano não vingou aqui?
S. A. – Como gostava de dizer Antonio Houaiss, discrepo. Temos um histórico farto de cadernos culturais: o “Suplemento” do Estado de S. Paulo; o também legendário SDJB (“Suplemento Dominical” do Jornal do Brasil), que apesar do nome saía aos sábados; o suplemento literário da Tribuna da Imprensa, editado por Mário Faustino; e, mais recentemente, o “Folhetim”, “Mais!”, “Leia Livros”, “Prosa e Verso”, “Sabático”.
Destaco duas observações suas. 1) “Assim como no resto do mundo, temos produzido bons e maus filmes, sendo que os maus continuam sobrepujando os bons, ainda que a nossa crítica especializada, no geral complacente e paternalista, tente nos convencer do contrário”; e 2) “O moderno cinema brasileiro não teria chegado aonde chegou senão fosse a participação ativa, entusiástica e, não raro, benevolente da imprensa, vale dizer, da crítica de 30 e tantos anos atrás [essa escrita em 1998]”. Quero contrapô-las à afirmação de Antoine de Baecque, crítico francês que chefiou os Cahiers du Cinéma: em Cinefilia, ele diz que nunca se escreveu tanto sobre filmes quanto agora, e nem tanta bobagem. Vivemos um momento difícil em relação à crítica de filmes?
S. A. – Fecho inteiramente com de Baecque. Existem hoje milhões de críticos de cinema na internet, muitos até são bons, mas cadê a Pauline Kael, o Jean Douchet da era digital?
Como você mesmo registrou, “as maiores emoções que o cinema já proporcionou ao público ocorreram em 1895 (quando chegou), em 1927 (quando falou) e em 1953 (quando agigantou-se)”. Poderíamos acrescentar aí o uso da cor, em 1935. Você incluiria o 3D como um desses marcos? No lançamento de A Invenção de Hugo Cabret, Scorsese se disse encantado com essa técnica, e criticou o clichê segundo o qual o 3D“só deve ser usado se tiver a ver com a história”. Qual sua opinião a esse respeito?
S. A. – Até prova em contrário, o 3-D é um gimmick perfeitamente dispensável, como o Cinerama. Wim Wenders usou-o inventivamente em Pina, mas gostaria de rever o filme em dimensões normais para testar sua imprescindibilidade. Se de fato veio para ficar, só daqui a alguns anos saberemos. Como o cinema hoje hegemônico é dirigido prioritariamente ao público infanto-juvenil, é provável que fique.
Em 2004, você disse que os documentários têm, “em sua dieta cinematográfica, o mesmo valor que, na alimentar, dá às saladas e legumes cozidos. Sei que fazem bem à saúde – do cinema e da gente – mas é quase por obrigação que deles me sirvo”. Contudo, de lá pra cá o país viu um certo boomdo gênero, com novos filmes de Eduardo Coutinho, o Santiago, do João Moreira Sales... Há alguma razão para que esse tipo de narrativa – que tem um parentesco com o jornalismo, de certa forma – tenha esse destaque?
S. A. – Há. É muito mais fácil rodar um documentário do que fazer um filme narrativo, de ficção. Mas criar um documentário original, com os de Eduardo Coutinho e João Moreira Salles, exige um talento especial, não é para qualquer bico. Ou seja, rodar um documentário ruim é bem mais fácil do que fazer um filme de ficção medíocre.
***
[Fabrício Marques é jornalista e diretor do SLMG]

quarta-feira, 13 de junho de 2012

TSE libera ranking de corrupção no Brasil



Confrontando dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o ranking da corrupção no Brasil foi o seguinte, medido pela quantidade de políticos cassados por corrupção desde 2000:
1º) DEM (69)
2º) PMDB (66)
3º) PSDB (58)
4º) PP (26)
5º) PTB (24)
6º) PDT (23)
7º) PR (17)
8º) PPS (14)
9º) PT (10)
10º) PV, PHS, PRONA e PRP (1)
Dos 623 políticos que foram cassados, quatro eram governadores e vices: Flamarion Portela, de Roraima, e Cássio Cunha Lima, da Paraíba, mantido no cargo por força de liminar do TSE. Os demais são senadores e suplentes (6), deputados federais (8), deputados distritais (13), prefeitos e vices (508) e vereadores (84).
De acordo com a pesquisa, o DEM é o partido que lidera o ranking (69), reunindo 20,4% dos políticos cassados.

quinta-feira, 7 de junho de 2012

CIA traficava drogas para financiar guerras



Lá no início da “guerra contra as drogas”, em 1971, os Estados Unidos já desenvolviam ao mesmo tempo o tráfico de heroína no Sudeste Asiático 

06/06/2012


Salvador Capote 
Após várias décadas da “guerra contra as drogas”, acompanhada por um custo colossal em vidas humanas e recursos materiais, os narcotraficantes hoje são mais fortes do que nunca e controlam um território maior do que em qualquer época.
Nos últimos seis anos, ocorreram no México mais de 47 mil assassinatos relacionados ao tráfico de drogas. O número de mortes foi de 2.119, em 2006, para cerca de 17 mil, em 2011. Em 2008, o Departamento de Justiça estadunidense advertiu que as OTDs (Organizações de Tráfico de Drogas), vinculadas a cartéis mexicanos, estavam ativas em todas as regiões dos Estados Unidos. Na Flórida atuam máfias associadas ao cartel do Golfo, aos Zetas e à Federação de Sinaloa. Miami é um dos principais centros de recepção e distribuição de drogas. Além dos mencionados, outros cartéis, como o de Juárez e o de Tijuhana, operam nos Estados Unidos.
Os cartéis do México ganharam maior força depois que substituíram os colombianos de Cali e Medellín nos anos 1990 e controlam agora 90% da cocaína que entra nos Estados Unidos. O maior estímulo ao narcotráfico é o alto consumo estadunidense. Em 2010, uma pesquisa nacional do Departamento de Saúde revelou que aproximadamente 22 milhões de estadunidenses maiores de 12 anos consomem algum tipo de droga.
Esses, que são apenas alguns dos mais inquietantes dados estatísticos, permitem questionar a eficácia da chamada “guerra contra as drogas”. É impossível crer que exista realmente uma vontade política para por fim a este flagelo universal quando observamos o papel desempenho o narcotráfico a serviço da contra-revolução, para a expansão das transnacionais e para as ambições geopolíticas dos Estados Unidos e outras potências.

Tráfico da CIA
 Repassemos, em síntese, a história recente. A administração de Richard Nixon, ao iniciar a “guerra contra as drogas” (1971), desenvolve ao mesmo tempo o tráfico de heroína no Sudeste Asiático com o propósito de financiar suas operações militares nessa região. A heroína produzida no Triângulo de Ouro (de onde se unem as zonas montanhosas do Vietnã, Laos, Tailândia e Myanmar) era transportada em aviões da “Air America”, propriedade da CIA (Agência Central de Inteligência). Em uma conferência de imprensa televisionada em primeiro de junho de 1971, um jornalista perguntou a Nixon: “Senhor presidente, o que você fará com as dezenas de milhares de soldados estadunidenses que regressam viciados em heroína?”
As operações do “Air America” continuaram até a queda de Saigon em 1975. Enquanto a CIA transportava ópio e heroína do Sudeste Asiático, o tráfico e consumo de drogas nos Estados Unidos se convertia em tragédia nacional. O presidente Gerald Ford solicitou ao Congresso, em 1976, a aprovação de leis que substituíssem a liberdade condicional com a prisão, estabelecessem condenações mínimas obrigatórias e negassem as fianças para determinados delitos envolvendo drogas. O resultado foi um aumento exponencial do número de condenados por delitos relacionados com o tráfico e consumo de drogas e, por conseguinte, conversão de Estados Unidos no país com maior população prisional do mundo. O peso principal desta política punitiva caiu sobre a população negra e outras minorias.
As administrações estadunidenses durante os anos 1980 e 1990 apoiaram a governos sul-americanos envolvidos diretamente no tráfico de cocaína. Durante a administração Carter, a CIA interveio para evitar que dois dos chefes do cartel de Roberto Suárez (rei da cocaína) fossem levados a juízo nos Estados Unidos. Ao ficar livres, puderam regressar a Bolívia e atuar como protagonistas no golpe de estado de 17 de julho de 1980, financiado pelos barões da droga. A sangrenta tirania do general Luis García Meza foi apoiada pela administração de Ronald Reagan.
A participação mais conspícua da administração Reagan no narcotráfico foi o escândalo conhecido como “Irã-Contras” cujo eixo mais propagandeado foi a obtenção de fundos para financiar o conflito nicaragüense mediante a venda ilegal de armas ao Irã, mas está bem documentado, ademais, o apoio de Reagan, com este mesmo propósito, ao tráfico de cocaína dentro e fora dos Estados Unidos.
O jornalista William Blum explica essas conexões em seu livro “Rogue State”. Na Costa Rica, que servia como Frente Sul dos “contras” (Honduras era a Frente Norte) operavam várias redes “CIA-contras” envolvidas com o tráfico de drogas. Estas redes estavam associadas com Jorge Morales, colombiano residente em Miami. Os aviões de Morales eram carregados com armas na Flórida, voavam à América Central e regressavam carregados de cocaína. Outra rede com base na Costa Rica era operada por cubanos anti-castristas contratados pela CIA como instrutores militares. Esta rede utilizava aviões dos “contras” e de uma companhia de venda de camarões que lavava dinheiro da CIA, no translado da droga aos Estados Unidos.
Em Honduras, a CIA contratou a Alan Hyde, o principal traficante nesse país (“o padrinho de todas as atividades criminais” de acordo com informações do governo dos Estados Unidos), para transportar em suas embarcações abastecimento aos “contras”.  A CIA, de volta, impediria qualquer ação contra Hyde de agências anti-narcóticos.
Os caminhos da cocaína tinham importantes estações, como a base aérea de Ilopango, em El Salvador. Um ex-oficial da CIA, Celerino Castillo, descreveu como os aviões carregados de cocaína voavam em direção ao norte, aterrizavam impunemente em vários lugares dos Estados Unidos, incluindo a base da Força Aérea no Texas, e regressavam com dinheiro abundante para financiar a guerra. “Tudo sob o guarda-chuva protetor do governo dos Estados Unidos”. A operação de Ilopango se realizava sob a direção de Félix Rodríguez (aliá, Max Gómez) em conexão com o então vice- presidente  George H. W. Bush e com Oliver North, quem formava parte da equipe do Conselho de Segurança Nacional de Reagan.
Em 1982, o diretor da CIA, William Casey, negociou um “memorando de entendimento” com o fiscal geral, William French Smith, que exonerava a CIA de qualquer responsabilidade relacionada às operações de tráfico de drogas realizadas por seus agentes. Este acordo esteve em vigor até 1995.
Reagan e seu sucessor, George H. W. Bush, patrocinaram  o “homem da CIA no Panamá”, Manuel Noriega, vinculado ao cartel de Medellín e à lavagem de grandes quantidades de dinheiro procedentes da venda da droga. Quando Noriega deixou de ser útil e se converteu em estorvo, os Estados Unidos invadiram Panamá (20 de dezembro de 1989) em um bárbaro ato sem precedentes contra o direito internacional e a soberania de um país pequeno.
Michael Ruppert, jornalista e ex-oficial do setor de narcóticos, apresentou em 1997 uma larga declaração, acompanhada de provas documentais aos comitês de inteligência (“Select Intelligence Committees”) de ambas Câmaras do Congresso. Em um dos parágrafos afirma: “A CIA traficou drogas não só durante a época dos “Irã-contras”, mas o tem feito durante todos os cinqüenta anos de sua história. Hoje lhes apresentarei evidências que demonstrarão que a CIA, e muitas figuras que se fizeram célebres durante o ‘Irã-contras’, como Richard Secord, Ted Shackley, Tom Clines, Félix Rodríguez e George H. W. Bush , venderam drogas aos estadunidenses desde a época do Vietnã.”
Em 1999, sob a administração de Bill Clinton, os Estados Unidos bombardearam impiedosamente o povo iugoslavo durante 78 dias. De novo aqui aparece o narcotráfico no fundo das motivações. Os serviços de inteligência dos Estados Unidos e seus homólogos da Alemanha e Grã-Bretanha utilizaram o tráfico de heroína para financiar a criação e o equipamento do Exército de Libertação de Kosovo. A heroína proveniente da Turquia e da Ásia Central passava pelo Mar Negro, Bulgária , Macedônia e Albânia (Rota dos Balcãs) com destino a Itália. Com a destruição da Sérvia e o fortalecimento – desejado ou não – da máfia albanesa, a administração Clinton deixava livre o caminho da droga desde o Afeganistão até a Europa Ocidental. De acordo com informes da DEA e do Departamento de Justiça dos Estados Unidos, cerca de 80 % da heroína que se introduz na Europa passa através de Kosovo.
“Planos” Colômbia
Várias administrações estadunidenses, e em particular a de George W. Bush, foram cúmplices do genocídio na Colômbia. A “guerra contra as drogas” sustentada pelos Estados Unidos com recursos financeiros multimilionários, assistência técnica e volumosa ajuda militar, não conseguiu deter o fluxo de cocaína e, pelo contrário, tem sido determinante no surgimento e desenvolvimento dos grupos paramilitares a serviço dos proprietários de terras com plantações de drogas, e também como pretexto para manter o domínio sobre os trabalhadores e a população camponesa. O Plano Colômbia resultou num completo fracasso, mas serviu como tela de fundo para a ingerência dos Estados Unidos no país e mostrou claramente seu verdadeiro objetivo, a contra-revolução.
Muitas vezes se esquece que o narcotráfico é provavelmente o negócio mais lucrativo dos capitalistas. Com a guerra na Colômbia lucram as empresas químicas que produzem os herbicidas, a indústria aeroespacial que abastece helicópteros e aviões, os fabricantes de armas e, em geral, todo o complexo militar-industrial. Os bilhões de dólares que gera o tráfico ilegal de drogas, também incrementam o poder financeiro das corporações transnacionais e da oligarquia local.
A recente declaração do Secretariado de Estado Maior Central das FARC-EP, em vista do quadragésimo oitavo aniversário do início da luta armada rebelde, denuncia este vínculo drogas-capital: “os dinheiros do narcotráfico se convertem em terras, inundam a banca, as finanças, os investimentos produtivos e especulativos, a hotelaria, a construção e a contratação pública, resultando funcionais e necessários no jogo de captação e circulação de grandes capitais que caracteriza a capitalismo neoliberal de hoje. Igualmente ocorre na América Central e no México.”
O Tratado de Livre Comércio Estados Unidos-México (NAFTA) obrigou numerosos camponeses, ante a competitividade de produtos agrícolas estadunidenses, a cultivar em suas terras papoula e maconha. Outros, frente à alternativa de trabalho escravo nas indústrias “maquiladoras”, preferem ingressar nas redes mafiosas da droga. O grande aumento do tráfico de mercadorias através da fronteira e dos controles bancários para combater o terrorismo, provocou a lavagem de dinheiro dos bancos até as corporações comerciais.  A complexidade e o volume das operações financeiras, e o fluxo instantâneo e constante de capitais “on line”, tornam extremamente difícil seguir o rastro das transações ilícitas.
Uma das conseqüências do NAFTA é a impunidade quase total que acompanha o fluxo de narcodólares em ambos lados da fronteira. Igualmente como no México, o Tratado de Livre Comércio recentemente em vigor na Colômbia estimulará a violência, o narcotráfico e a repressão sobre os trabalhadores e camponeses. A “Iniciativa Mérida”, apor sua vez, é somente a versão ‘México-Centroamericana’ do Plano Colômbia.
Devemos meditar sobre o fato de que em todos os cenários de onde os Estados Unidos têm intervindo militarmente, principalmente naqueles onde tem ocupado a sangue e fogo o território, o narcotráfico, sem diminuir, como seria de esperar, está multiplicado e fortalecido. No Afeganistão, o cultivo de papoula se reduziu drasticamente durante o governo dos talebãs para alcançar logo, sob a ocupação estadunidense, um crescimento acelerado. O Afeganistão é atualmente o primeiro produtor de ópio do mundo, mas, ademais, já não exporta somente em forma de pasta para seu processamento em outros países, mas fabrica a heroína e a morfina em seu próprio território.
Se nos atemos aos fatos históricos, poderíamos afirmar que a política dos Estados Unidos não tem sido a de “guerra contra as drogas”, senão a de “drogas para a guerra”. (da alainet.org)
Tradução: Eduardo Sales de Lima