sábado, 7 de julho de 2012

Na moral? Desligue a TV e vá ler um livro. Mas volte.


Por Malu Fontes
Nas últimas semanas, não apenas o telespectador, mas o leitor de jornais, de sites, o dono de qualquer conta de e-mail, usuário de redes sociais e qualquer brasileiro que não esteja em Marte vem sendo bombardeado com saraivadas de informação emitidas com potência de míssil publicitário pela Rede Globo sobre as estreias de Gabriela, Fátima Bernardes e Pedro Bial. A divulgação é tão massiva que o público fica sabendo delas mesmo involuntariamente, mesmo que não tenha o menor interesse em ver tais atrações. E a Globo, quando se trata de jornalismo de umbigo, ou seja, de transformar em pauta seu próprios produtos, é mais eficiente que milagreiro.
SACO DE VENTO – Nesta quinta, Bial estreou o seu “Na Moral’, anunciado aos quatro ventos como um programete cabeça, para discutir em profundidade temas decolados e com convidados e atrações idem. A primeira edição foi um assombro do que a TV é capaz de dizer e fazer para convencer o público médio de que usa verniz quando, na verdade, oferece madeira de demolição corroída de cupim. O programa, antes de tudo, exige uma maratona de teimosia do público, pois, para chegar a ele, era preciso esperar as peripécias peripatéticas do casamento do parlapatão Cadinho em Avenida Brasil, passar pela Grande Família, arranhar os ouvidos com a baianidade caricata prosódica do elenco de Gabriela e finalmente deparar-se com o saco de vento de Bial.
NO PAU DO GATO – Dizendo-se um programa de debate, Na Moral é, como se deve esperar de debates na TV aberta, pílula de farinha fast food disfarçada de conversa cabeça. Na estreia, o programa já disse o quanto está disposto a brincar de circo. Num tapete com ares de persa fake da 25 de março, colocou um elenco improvável mas apropriadíssimo para esse tipo de atração: um professor de filosofia, Luiz Felipe Pondé, hoje o intelectual mais badalado da mídia eletrônica e de revistas ditas antenadas, e já chamado no Twitter de Caco Antibes da filosofia, por suas posições arrasadoras sobre o politicamente correto e sobre tudo o que diz respeitos aos ditos fracos e oprimidos. Ou frascos e comprimidos, como prefere Rita Lee; uma gostosa, desbocada e decotadíssima, Maria Paula, agora se reivindicando psicóloga, com nada a dizer sobre tudo a partir do seu batom carmim (a sua pérola da noite foi confessar que, ao invés de cantar ‘atirei o pau no gato’, prefere mesmo é se atirar no pau do gato (sic)) e um professor com trejeitos de cientista maluco para fazer exatamente o papel do freak circense: Antonio Carlos Queiroz, o autor da Cartilha do Politicamente Correto, segundo ele censurada pelo então presidente Lula. Queiroz usava uma boina quadriculada que não ficaria bem na TV nem na cabeça de um inglês com cachimbo e parecia, com uma caneta baratinha na mão, estar em cima de um caixote na praça, vociferando contra os impropérios cometidos contra Tia Nastácia, o Saci e não sei mais quem…
Aliado a isso, Alexandre Pires bancando um DJ que não tocava nada, instalado num cenário hype, ilustrado com grafismos, objetos vintage e um livro vermelho de arquitetura, para dar um ar descolado, claro. Ah, e tinha ainda um ineditismo: a primeira platéia completamente muda da TV Brasileira. Mas é preciso confessar: mesmo muda e imóvel, fica mil vezes melhor na fita que a espalhafatosa e inacreditável platéia collor block desocupada de Fátima Bernardes. Já Bial, cada vez que aparecia e começava a falar em close, dava a nítida impressão que iria anunciar com os teasers de sempre o eliminado do dia do BBB. E o mais engraçado: com tanta gente e um assunto anunciado como tão sério, a ditadura do politicamente correto e o assédio sexual e moral no trabalho, o tempo era inexistente: meia hora. Descontado o tempo dos intervalos comerciais, o tempo de um cochilo, já que passava da meia noite.
AÇOUGUE – Sim, na TV aberta, a receita para um debate profundo e cabeça é juntar uma fauna, um apresentador fazendo o tipo gatão de meia idade, durar meia hora, não deixar ninguém dizer nada que ultrapasse a faixa dos segundos e terminar como tudo termina na cultura de massa: no mercado das carnes. Ao final, atores vestidos de macaco e um açougue de mulheres de biquínis exíguos, metros de bunda, trocentos mililitros de peitos e coxas que fazem as mulheres horti-fruti parecerem sílfides, pagodeavam rebolizantes no vídeo.
O melhor do primeiro Na Moral foi a deixa possibilitada pela trilha sonora de encerramento. Os créditos do programa subiram ao som de Falcão, o ícone pop do brega kitsch, entoando ‘homem é homem, menino é menino e viado é viado”. É mesmo. E TV é TV, entretenimento em pílulas aceleradas que divertem anunciando que debatem. Quer debater ou aprender alguma coisa? Recupere o mantra engraçadinho que a MTV tinha há tempos: desliga essa TV e vai ler um livro. Mas volte, pois, na moral, quem gosta de profundidade é escafandrista ou os interessados nas técnicas de propulsão do Pré-Sal.

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