terça-feira, 12 de outubro de 2010

Texto de Aloysio Biondi, em 07/08/1999 - Vale a pena ler



 Para que ninguém esqueça o passado recente. O texto nada tem de
eleitoreiro, em 1999 o Lula já tinha sido eleito, nem de revanchista, o
Biondi jamais ocupou cargo público, sendo jornalista reconhecido
internacionalmente e intelectual independente.

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*Aloysio Biondi* - *7 de agosto de 1999*

Reverencialmente, peço licença ao mestre Celso Furtado para repeti-lo:

“Nunca estivemos tão longe do país com que sonhamos um dia”.

Uma pequena frase. Capaz, porém, de detonar um turbilhão de lembranças, das
emoções e expectativas, dos dias em que o Brasil era um país e tinha sonhos.
Um povo que sonhava virar Povo. Estudantes, intelectuais, empresários,
trabalhadores, agricultores, classe média envolvidos no debate pelo
desenvolvimento, conscientes, todos, de que havia um preço a pagar,
resistências a enfrentar. Inimigos, interesses externos a vencer. Um país
com alma, sonhos.

Durante 40 anos, 45 anos, houve crises de todos os tipos. Mas havia o
amanhã, a promessa do amanhã. A busca do amanhã. Um lugar no mundo. Na
década de 50, com a economia resumida praticamente ao café, açúcar, algodão
e outros produtos agrícolas, o país lançou-se à loucura de buscar a
industrialização. Sem dólares para importar máquinas e equipamentos, pois os
preços dos produtos agrícolas estavam de lastros no mercado mundial,
estrangulando países pobres como o Brasil. Mesmo assim, o país ousou. Era a
época em que os intelectuais e formadores de opinião escreviam livros,
artigos, teses sobre e contra as políticas de estrangulamento que os países
ricos impunham a países como o Brasil. Ou faziam músicas, peças teatrais,
filmes sobre a realidade brasileira. Reforçavam a alma brasileira. O sonho
realizável. Será que dona Ruth Cardoso se lembra disso?

Chegou a década de 60, e com ela o golpe militar inspirado pelos EUA,
desvios de rota que, no entanto, não conseguiram enterrar de vez os sonhos
de construção de um país... A alma nacional resistia. Veio a crise do
petróleo, no começo dos anos 70, e o país, que produzia 130 mil barris por
dia, mergulhou novamente no abismo da falta de dólares, na recessão, no
avanço da miséria. Um país “quebrado”, com total falta de dólares, mas que
insistia em sonhar com um amanhã.

Em nome desse sonho, novamente, a população pagou a conta. O governo
contraiu dívidas fabulosas, criou impostos, apertou o cinto e o crânio dos
brasileiros, para canalizar o dinheiro disponível, dos impostos ou
empréstimos, para montar indústrias capazes de fornecer produtos que ainda
eram importados, de aço a alumínio, de celulose a petroquímicos, de máquinas
a sistemas de telecomunicações. Substituir importações para economizar
dólares, necessários para a compra do petróleo, ainda não descoberto em
grande escala no território brasileiro.

Para atender a todas essas novas indústrias, era preciso também construir
usinas, as Itaipus, rodovias, ferrovias (o Brasil chegou a produzir 5.000
vagões por ano, com encomendas do governo), sistemas de telecomunicações.
Mais aperto de cinto, mais impostos, menos dinheiro para as questões
sociais, nunca esquecidas nem mesmo nos debates e escritos dos economistas,
ou de empresários. Mas havia a esperança do amanhã. O sonho, de que fala
mestre Furtado, de um país economicamente forte, exatamente por dispor de
todos os recursos naturais para isso, mas também capaz, ao atingir esse
estágio, de maior justiça social, de extinção da miséria. Habitado por um
Povo. Orgulhoso de si. Solidário, porque se reconhecendo no outro.

No começo dos anos 90, o sonho estava ao alcance da mão, o amanhã chegava. O
Brasil conquistara uma posição entre as dez maiores economias do mundo.
Melhor ainda: o Brasil nadava em dólares, porque era capaz de realizar
exportações muito maiores do que as importações. Poucos se lembram disso
hoje, mas o Brasil tinha um dos maiores saldos comerciais positivos
(exportações menos importações) do mundo, na casa dos 10 a 15 bilhões de
dólares por ano. Tinha dólares seus, não precisava mais de empréstimos ou de
capital das multinacionais para realizar investimentos e manter a economia
em expansão, para criação de empregos e solução dos problemas do seu povo.
Foi ontem, e está tudo tão distante.

A serviço de outros países, o governo escancarou o mercado às importações e
às multinacionais. Feiticeiros malditos transformaram o saldo positivo da
balança comercial em um “rombo” permanente, deram vantagens na cobrança de
impostos sobre a remessa de juros e de lucros estimulando o envio de dólares
para o exterior, elevaram os juros para cobrir os rombos criados,
“quebraram” assim a União, Estados, Municípios. Destruíram a indústria e a
agricultura. Em cinco ou seis anos, clones malditos dos intelectuais de
ontem destruíram o que havia sido construído ao longo de décadas. Destruíram
mais. Destruíram o sonho, a Alma Nacional.

O que somos hoje? Um quintal dos países ricos? Não. Somos um curral. Bovinos
ruminando babosamente enquanto o vizinho do lado, o trabalhador, o
funcionário público, o aposentado, o agricultor, o empresário, todos, um a
um, são arrastados para o grande matadouro em que o país se transformou, com
suas mil formas de abate como o desemprego, os cortes na aposentadoria, as
falsas reformas do funcionalismo, a falência, as importações. Bovinos
ruminando no curral, enquanto empresas de todos os portes são engolidas por
grupos estrangeiros e até o petróleo, ou os campos mais fabulosos de
petróleo do mundo, com poços capazes de produzir 10.000 (dez mil) barris por
dia, em um único poço, são entregues a preço simbólico às multinacionais.

Em cinco anos, o governo Fernando Henrique Cardoso não destruiu apenas a
economia nacional, tornando-a dependente do exterior. Seu crime mais
hediondo foi destruir a Alma Nacional, o sonho coletivo. Para isso, e com a
ajuda dos meios de comunicação, jogou o consumidor contra os empresários
nacionais, “esses aproveitadores”; o contribuinte contra os funcionários
públicos, “esses marajás”; o pobre contra os agricultores, “esses
caloteiros”; a opinião pública contra os aposentados, ”esses vagabundos”.

No governo FHC, o brasileiro foi levado a esquecer que, em qualquer país do
mundo, a sociedade só pode funcionar com base em objetivos que atendam aos
interesses, necessidades de todos – ou, mais claramente, não se pode por
exemplo ter uma política de importação indiscriminada, a pretexto de
beneficiar o consumidor, sem provocar desemprego e quebra de empresas. Ou, a
longo prazo, desemprego generalizado.

Com o jogo perverso de estimular a busca de pretensas vantagens individuais,
o governo FHC destruiu a busca de objetivos coletivos. Destruiu a Alma
Nacional, o Projeto Nacional. A violenta desnacionalização sofrida pelo
Brasil, em sua economia, vai eternizar a remessa de lucros, dividendos,
juros para o exterior. Isto é, vai torná-lo totalmente dependente da boa
vontade dos governos de países ricos em fornecer dólares e, portanto, de
ordens e autorizações desses governos de países ricos. Uma espécie de
colônia, mesmo, como alertou o economista Celso Furtado em palestra que ele
encerrou com sua frase, arrasadora para quem viveu o Brasil de 50 para cá,
“nunca estivemos tão distante do Brasil com que um dia sonhamos”.

Mesmo sem tê-lo consultado a respeito, uma sugestão: escreva a frase de
Furtado em um pedaço de papel, e a releia todos os dias. Ou faça decalques
com ela. Sugira que seus amigos façam o mesmo.

E comece a agir. Ainda há tempo de ressuscitar a Alma Nacional, antes que o
Brasil vire colônia.

2 comentários:

  1. Sou Cacondense como o Aloysio, fã e seguidor dos brilhantes artigos dele, o que me leva a desconfiar que a autoria desse artigo é tão verdadeira quanto os títulos de mestrado e doutorado da Dilma na Unicamp.
    E mais, chamo a atenção para o fato de já começar com uma mentira, pois em 1999 Lula não tinha sido eleito nem sindico de prédio. Onde esse artigo foi publicado para eu checar?

    Hugo Orrico Jr.

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  2. Lula, já havia sido eleito Dep. Federal em 1986.
    Não sei se foi engano do autor da introdução,ao pensar em termos de Presidencia, e lamentavelmente acabei cortando o nome, no passar para o blog, mas que, caso tenha sido isso trata-se de Carlos Antonio Akselrud de Gouveia.
    Quanto ao texto, vc pode encontrá-lo, aqui:

    http://aloysiobiondi.com.br/spip.php?article731&var_recherche=Bundas

    Grato pela participação!!

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Posso não publicar, baseado nas regras de civilidade que prezo. Obrigado.