Cândido Grzybowski*
A grande crise financeira, que estourou em 2008, ressurge com violência, agora com o epicentro na Europa, ameaçando a construção da própria unidade monetária baseada no euro. Por trás de tudo, um ataque à própria ideia de União Européia, com sua proposta de região e solidariedade entre povos, que permitiu avanços monumentais. Descobrimos, mais uma vez, que, em um mundo interdependente, ninguém escapa. As tais forças do mercado contaminam e corrompem tudo quando governos aceitam ser conduzidos por elas. Aliás, os agentes do mercado – bancos, financeiras, fundos – viram conselheiros dos próprios governos, como na Grécia, e montam o desastre, mas não pagam a conta. Pior, o próprio projeto de região solidária e da moeda única ficou contaminado quando os principais governantes europeus aderiram à onda neoliberal.
Não é a intenção abordar o lado “cassino” da globalização neoliberal, promotora da financeirização desregulada e sem limites das últimas décadas. O fato é que a economia real, os governos e a qualidade de vida dos povos estão em jogo. Os altos e baixos, as bolhas e seus estouros, as quebradeiras, todo esse mundo financeiro em crise tem por trás um conjunto de crises articuladas que mostram a insustentabilidade do modo como nos organizamos, produzimos e vivemos. O que interessa é se perguntar até quando a humanidade vai tolerar e sofrer com este estado de coisas. Por onde vamos começar a inverter as tendências destrutivas de hoje, reveladas nesta “crise de civilização”? Mais imediatamente, onde e quando fixaremos limites ao livre mercado, aos especuladores, aos operadores do “cassino global”?
Não é a intenção abordar o lado “cassino” da globalização neoliberal, promotora da financeirização desregulada e sem limites das últimas décadas. O fato é que a economia real, os governos e a qualidade de vida dos povos estão em jogo. Os altos e baixos, as bolhas e seus estouros, as quebradeiras, todo esse mundo financeiro em crise tem por trás um conjunto de crises articuladas que mostram a insustentabilidade do modo como nos organizamos, produzimos e vivemos. O que interessa é se perguntar até quando a humanidade vai tolerar e sofrer com este estado de coisas. Por onde vamos começar a inverter as tendências destrutivas de hoje, reveladas nesta “crise de civilização”? Mais imediatamente, onde e quando fixaremos limites ao livre mercado, aos especuladores, aos operadores do “cassino global”?
Os governos parecem começar a acordar. Mas, nos últimos dois anos de crise aberta, o que fazem é a transferência da conta da crise do mercado para o Estado, socializando as perdas e buscando repor as coisas no lugar, sem mudar verdadeiramente. Faltam novas políticas e governos comprometidos com o bem comum público, apontando para mudanças substantivas no modelo de desenvolvimento e organização da economia.
De toda forma, a principal mudança deve ocorrer na arquitetura do poder mundial e no resgate de sua função reguladora, de forma democrática, para quebrar a lógica cassino e o poder destrutivo da globalização puxada pelo livre mercado. Mudanças geopolíticas são visíveis e mais aceleradas no contexto de crise, como se os velhos países dominantes econômica e militarmente já não tivessem o monopólio das soluções. O multilateralismo, de forma ainda capenga, volta a merecer atenção.
Mas o que esperar disso tudo? Tomemos o G-20, até aqui a principal novidade no enfrentamento da crise. Novidade? Ou apenas ampliação do G-8 para fazer o mesmo e deixar de fora, sem papel significativo no poder mundial, os outros mais de 170 países? O G-20 parece, definitivamente, feito para nada mudar e, acima de tudo, não mudar no modo de decidir e gerir o mundo. Trata-se de um clube fechado de governantes, pouco inclinado a ser público, a ser aberto às demandas da sociedade. As suas reuniões, até aqui, não foram tão repressivas como as do G-8, cada vez mais longe das pessoas e sob forte proteção policial. Mas, definitivamente, não têm o mínimo de transparência e democracia. O convite aos grandes executivos de conglomerados econômicos e financeiros privados não dá legitimidade democrática ao clube do G-20.
No entanto, seus debates e decisões podem nos afetar, e muito. A chanceler alemã Angela Merkel acaba de organizar, em Berlim, dias 19 e 20 de maio, uma conferência internacional sobre a regulação do mercado financeiro. Fora as autoridades financeiras, só executivos de grandes grupos foram convidados a participar das discussões. Nenhuma abertura para as organizações da sociedade civil, como se não fosse um assunto de extremo interesse e onde a emergente cidadania planetária vem acumulando enorme expertise (o Fórum Social Mundial é exemplo disso).
A conferência em Berlim visa preparar a próxima cúpula do G-20 em Toronto, Canadá, em junho. Dado a sua composição e formato, nada de substantivo é de se esperar em termos de taxação das transações financeiras mundiais e de enfrentamento dos paraísos fiscais, os tentáculos do “cassino global”. Enquanto isso, continuaremos sendo inundados por notícias sobre a necessidade do sacrifício das condições de vida na Grécia, Espanha, Portugal, Irlanda e até Inglaterra, para que os “mercados” se sintam mais confortáveis. Nos países do grande Sul do mundo, já conhecemos o desastre. O sistema como um todo precisa de ajuste estrutural para valer, tendo a preocupação com o bem estar e os direitos humanos fundamentais para todos os povos. Para começar, precisamos evitar buscar soluções onde não estão. A solidariedade entre os povos e a criação de movimentos cidadãos irresistíveis ainda são a principal força de empuxe para um outro mundo.
*Sociólogo e diretor do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase).
Texto publicado na Agência Carta Maior, em 18/5/2010.
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